sexta-feira, 8 de maio de 2009

In between

Minha mãe é super família. Sempre liga no aniversário, sempre liga pra conversar fiado, sempre está lá por qualquer ente necessitado. Meu pai é super anti-família. Quando eu tinha nove anos, ele se separou da minha mãe e de alguma maneira achou que isso significava separar-se de tudo que tinha ficado com ela - inclusive eu e minhas irmãs. Liga daquele jeito, encontra daquele jeito. Seus irmãos, nossos padrinhos, entenderam da mesma maneira e também separaram-se da gente, de maneira a nem ligar pra dar feliz aniversário. Eu cresci... e fiquei no meio. Não gosto de muita confusão, considero a família paterna um sistema solar desconhecido, com o qual estabeleci contato há anos-luz, e ficou por isso. Gosto da família da minha mãe, mas só tenho contato mesmo com a "familinha": meus avós, minhas tias e meu primo preferido, Bruno, que sempre aparece.
Minha mãe é a pessoa mais sociável desse planeta. É sempre amor à primeira vista: ela conversa com todo mundo, conta casos, morre de rir e arrecada milhões de fãs a cada parada. Faz tudo pelos amigos, é capaz de se compadecer, rir e chorar com cada um deles, e tem um poder de perdoar os outros que daria inveja a Jesus Cristo. Meu pai é bem anti-social: aquele vozeirão, misturado à pose de deputado recém-eleito, acabam afastando as pessoas -ou pelo menos fazendo com que os que animam a fazer-lhe companhia falem mal dele pelas costas, talvez pela ameaça que a figura dele representa, talvez pela aparente falta de simpatia - aparente, porque ele consegue ser um cara ironicamente simpático, sarcasticamente divertido. Eu sou sociável e bem sem-noção ao mesmo tempo. Tenho muitos amigos, mas pouquíssimos verdadeiros, odeio telefone e adoro uma cerveja, o que me torna aparentemente um ser de muitos amigos, mas realmente de poucos fãs (amigos que gostam de vc quando está chovendo também).
Minha mãe adora uma novela, e meu pai adora reclamar da vida e dos outros. O choro da minha mãe assistindo a qualquer evento patético da novela das oito contrasta drasticamente com a acidez do meu pai quando ele resolve dizer que tudo é ridículo, péssimo, que as pessoas são basicamente um bando de bossais querendo seu lugar ao sol. Minha mãe cantava Trio Parada Dura e meu pai se vestia como John Lennon. Quando eles se separaram e foram dividir os discos, dava pra ver nitidamente de quem era o Milionário e José Rico e o Animals do Pink Floyd. Eu fiquei assim, gosto de Bob Dylan e de forró, elogio e critico as pessoas quase na mesma proporção. Me emociono assistindo a um episódio do Chaves - aqueles em que ele sai da vila me cortam o coração - e acho a televisão de massa simplesmente uma merda (gosto, sim, de um bom filme). Já virou um hábito falar mal de pessoas que eu não conheço - sabe essas figuras que aparecem na rua e só dá pra imaginar "De que nave veio essa criatura?"? Volta pra Urano, filho de Deus...
Minha mãe se compadece de todo e qualquer ser vivente; meu pai ignora a existência de qualquer ser vivente que não seja ele ou sua rainha perpétua. E do cruzamento entre Madre Tereza e Jô Soares, nasce uma menina bem mal-humorada, que gosta tanto de uns quanto ignora os outros. Que fique bem claro, isso não é um exercício, é apenas um fato. Sou uma ótima amiga para meus amigos, uma ótima companheira para os butequeiros, e um ser à parte pra quem está longe do meu alcance. Ligo, mas não vou, falo, mas não ligo, abraço, mas não procuro. Penso tanto que não dá tempo...
Não sei se poderia ser de outra forma, nem se eu gostaria que fosse diferente. Não sei se agradeço ou me penitencio. Mas na real? Creio que tudo isso acaba por me tornar um ser no mínimo divertido... Ia até mandar um palavrão, mas o Ultraje a Rigor faz isso bem melhor!

4 comentários:

  1. é tão engraçado (ou trágico?) como nós conseguimos nos descrever e até nos justificar quando pegamos como referência pai e mãe! E quando falta um, é isso tambem que justifica algum buraco que ha em nossa conduta...

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  2. o mais estranho é perceber que você herda alguns comportamentos que jamais teria se pudesse escolher... ser humano é uma coisa de louco mesmo...

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  3. adorei o texto!! e é tudo verdade! e muito me impressionou a sua "lucidez"... mas, afinal, é o tal de que somos humanos né... bjos irmã!
    ps: "casamento da Madre Teresa com Jô Soares"... hahaha, mto bom!

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  4. ainda bem que vc conhece a história e não me deixa mentir, hehehe... bjo!

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