domingo, 28 de fevereiro de 2010

Letter of complaint

If only I could choose
to win or to lose
I'd win our hopes back
and lose this silly kindness
which makes me believe
when I should attack.

Letter of complaint

If only I could choose
to win or to lose
I'd win our hopes back
and lose this silly kindness
which makes me believe
when I should attack.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Religião

Tá tudo errado.
Inacabado.
Inesperado.
Chato sem saída
descolorido
baita dividida...
Aí eu vejo aquela nuvem branca.
Ah, aquela nuvem branca!...
E por baixo da nuvem branca
vem o sol amarelo
brilhando
reluzindo
derretendo a sede por paz no meu castelo
Ele vem chegando
se espalhando
devagarinho
e a nuvem branca vai sumindo
se perdendo.
O sol amarelo já sabe de cor o caminho:
inunda minha cidadela
transita sem dizer nada
por cada beco, cada ruela,
exultante como o mel...
.
Obrigada, Brahma -
a ti sempre serei fiel!

Religião

Tá tudo errado.
Inacabado.
Inesperado.
Chato sem saída
descolorido
baita dividida...
Aí eu vejo aquela nuvem branca.
Ah, aquela nuvem branca!...
E por baixo da nuvem branca
vem o sol amarelo
brilhando
reluzindo
derretendo a sede por paz no meu castelo
Ele vem chegando
se espalhando
devagarinho
e a nuvem branca vai sumindo
se perdendo.
O sol amarelo já sabe de cor o caminho:
inunda minha cidadela
transita sem dizer nada
por cada beco, cada ruela,
exultante como o mel...
.
Obrigada, Brahma -
a ti sempre serei fiel!

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

O reino dos cara-dura

Sempre quando percebo que estou tentando me aventurar em um universo onde as pessoas fazem aquilo bem melhor, muito melhor, indubitavelmente verdadeiramente melhor, fico murcha, perco a fé. Quem foi o maluco que me disse que eu tinha um dom? O problema foi que eu acreditei, viu? Fui entrando devagar no mundo da música. Cantando, compondo, palpitando. E ouvindo. De Billie Holiday a Madeleine Peyroux, de Cássia Eller a Adriana Calcanhoto. Impressionada com a identidade vocal da Pity. Impressionada com a popularidade sem classe da Ivete Sangalo. Sentia a angústia de Julian Casablancas, sentia o desespero de Kurt Cobain; a força de Chris Cornell; a explosão de Zack de la Rocha; a suavidade de Zach Condon, a poesia do Buena Vista e de Bob Dylan... a purpurina de David Bowie. Abria a boca e pensava em Marisa - que desgosto você teria... Escrevia e me vinha Chico - que fraude, que mico... Fui abrindo as portas da literatura sem pedir licença. Tornei-me fã do Guimarães e do Garcia Marques. Flaubert e Sabino me fizeram chorar, mas Wilde, Rubem e Dostoiévski... ah, esses me dilaceram! Aí resolvo escrever um poema e morro de vergonha da Sylvia Plath, da Cecília... escrevo um conto e penso em Clarice, em Machado de Assis, que devem estar se revirando embaixo da terra com tamanha audácia! Quem é você, vil criatura? Achando que sabe das coisas? Ainda bem que existe o reino dos cara-dura. Lá a água bate mas nunca fura. Lá eu canto, escrevo, e finjo que estou madura.

O reino dos cara-dura

Sempre quando percebo que estou tentando me aventurar em um universo onde as pessoas fazem aquilo bem melhor, muito melhor, indubitavelmente verdadeiramente melhor, fico murcha, perco a fé. Quem foi o maluco que me disse que eu tinha um dom? O problema foi que eu acreditei, viu? Fui entrando devagar no mundo da música. Cantando, compondo, palpitando. E ouvindo. De Billie Holiday a Madeleine Peyroux, de Cássia Eller a Adriana Calcanhoto. Impressionada com a identidade vocal da Pity. Impressionada com a popularidade sem classe da Ivete Sangalo. Sentia a angústia de Julian Casablancas, sentia o desespero de Kurt Cobain; a força de Chris Cornell; a explosão de Zack de la Rocha; a suavidade de Zach Condon, a poesia do Buena Vista e de Bob Dylan... a purpurina de David Bowie. Abria a boca e pensava em Marisa - que desgosto você teria... Escrevia e me vinha Chico - que fraude, que mico... Fui abrindo as portas da literatura sem pedir licença. Tornei-me fã do Guimarães e do Garcia Marques. Flaubert e Sabino me fizeram chorar, mas Wilde, Rubem e Dostoiévski... ah, esses me dilaceram! Aí resolvo escrever um poema e morro de vergonha da Sylvia Plath, da Cecília... escrevo um conto e penso em Clarice, em Machado de Assis, que devem estar se revirando embaixo da terra com tamanha audácia! Quem é você, vil criatura? Achando que sabe das coisas? Ainda bem que existe o reino dos cara-dura. Lá a água bate mas nunca fura. Lá eu canto, escrevo, e finjo que estou madura.

Miragem

Sou um espelho bonito;
tudo que eu quero
eu reflito:
beleza
felicidade
e fim de conflito.

Miragem

Sou um espelho bonito;
tudo que eu quero
eu reflito:
beleza
felicidade
e fim de conflito.

Satisfação

O esperto só ganha
pro outro poder perder
ri quando faz o outro sofrer
acha bonito
dizer que os fracos
não têm vez;
a beata vai à missa
põe dinheiro na caixinha
e não paga à criada
analfabeta e assalariada
há mais de um mês;
Vejo coisas estranhas
a todo tempo,
o tempo todo
um vendaval
que vem de uma vez.
Queria ser bicho pra não preocupar
queria quando triste poder me esconder
queria escolher o que me perturbar
poder fechar os olhos e me ver
sozinha, fria, longe do que não chegar
rir dia e noite pra ninguém perceber
surpreender com meu belo cantar
até uma lágrima aparecer
pra eu poder nascer
e crescer
e voltar...
pra eu poder morrer.

Satisfação

O esperto só ganha
pro outro poder perder
ri quando faz o outro sofrer
acha bonito
dizer que os fracos
não têm vez;
a beata vai à missa
põe dinheiro na caixinha
e não paga à criada
analfabeta e assalariada
há mais de um mês;
Vejo coisas estranhas
a todo tempo,
o tempo todo
um vendaval
que vem de uma vez.
Queria ser bicho pra não preocupar
queria quando triste poder me esconder
queria escolher o que me perturbar
poder fechar os olhos e me ver
sozinha, fria, longe do que não chegar
rir dia e noite pra ninguém perceber
surpreender com meu belo cantar
até uma lágrima aparecer
pra eu poder nascer
e crescer
e voltar...
pra eu poder morrer.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

A distância mora no coração de quem a criou.

A distância mora no coração de quem a criou.

Distância

Eles haviam sido separados por uma guerra que não deixou nada, a não ser medo e angústia. Foi-lhes tomada a família numa manhã de abril, durante o café, e o pavor fora sufocado pela chuva que caía sem cerimônia.
Quatro décadas depois, ele se lembrava exatamente daquele dia enquanto tomava seu café. Olhou para a aliança que mantivera em sua mão esquerda e sentiu saudade. Fechou os olhos para tentar imaginar o rosto dela. Eram dez horas, e o silêncio da livraria permitia que ele se lembrasse de cada detalhe. Lembrou-se de seus olhos apertados e serenos, muito azuis, de seu sorriso sincero... singelo. Sonhava então, e concentrou-se para sentir seu perfume. Como eram perfumados aqueles cabelos... Queria chegar mais perto, queria sentir o calor de suas mãos, e foi se aproximando lentamente, com muito cuidado para que aquele momento não lhe escapasse.
Ali, no meio dos livros, de olhos fechados, pôde sentir de novo o cheiro doce dos cabelos dela. Emocionou-se. Com paciente e contida euforia, assistiu ao encontro de mãos tão conhecidas. Sentiu o calor de suas mãos tão pequeninas e macias, sentiu o grande anel que ela carregava para selar o amor que um dia batera-lhe à porta. Tinha o coração aos pulos... Abriu os olhos.
Alguém segurava sua mão. Viu aquele anel cintilante brilhar na mão pequena que apertava a sua. Ergueu os olhos. A senhora chorava. Ele recompôs-se devagar e olhou dentro dos olhos dela. Ficaram assim por algum tempo, de mãos dadas, olhando-se com ternura. Abraçaram-se longamente e choraram em silêncio.
A chuva caiu.

Distância

Eles haviam sido separados por uma guerra que não deixou nada, a não ser medo e angústia. Foi-lhes tomada a família numa manhã de abril, durante o café, e o pavor fora sufocado pela chuva que caía sem cerimônia.
Quatro décadas depois, ele se lembrava exatamente daquele dia enquanto tomava seu café. Olhou para a aliança que mantivera em sua mão esquerda e sentiu saudade. Fechou os olhos para tentar imaginar o rosto dela. Eram dez horas, e o silêncio da livraria permitia que ele se lembrasse de cada detalhe. Lembrou-se de seus olhos apertados e serenos, muito azuis, de seu sorriso sincero... singelo. Sonhava então, e concentrou-se para sentir seu perfume. Como eram perfumados aqueles cabelos... Queria chegar mais perto, queria sentir o calor de suas mãos, e foi se aproximando lentamente, com muito cuidado para que aquele momento não lhe escapasse.
Ali, no meio dos livros, de olhos fechados, pôde sentir de novo o cheiro doce dos cabelos dela. Emocionou-se. Com paciente e contida euforia, assistiu ao encontro de mãos tão conhecidas. Sentiu o calor de suas mãos tão pequeninas e macias, sentiu o grande anel que ela carregava para selar o amor que um dia batera-lhe à porta. Tinha o coração aos pulos... Abriu os olhos.
Alguém segurava sua mão. Viu aquele anel cintilante brilhar na mão pequena que apertava a sua. Ergueu os olhos. A senhora chorava. Ele recompôs-se devagar e olhou dentro dos olhos dela. Ficaram assim por algum tempo, de mãos dadas, olhando-se com ternura. Abraçaram-se longamente e choraram em silêncio.
A chuva caiu.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Capítulo 18: Que rei sou eu?

Pois é, gente, acho que não podia continuar essa saga sem tocar em um ponto muito importante - talvez o mais importante pra mim. Antes de viajar, digamos que minha vida não estava lá aquela maravilha em nenhum quesito. Com isso, só precisei de um email da minha amiga Marina, que já se encontrava do outro lado do oceano, pra mergulhar de corpo e alma nessa empreitada. Como minha amiga estava um bocado ocupada por lá - e só quando cheguei em Londres vi que não há realmente outra opção viável - resolvi ir a uma agência especializada pra agilizar tudo. Escolhi bem. A primeira pergunta que me fizeram ao chegar foi: o que exatamente você quer fazer em Londres? Estudar e, se possível, trabalhar também. Fácil, né? As respostas sempre na ponta da língua. Você é professora de inglês... o curso seria nessa área? Não queria fazer nada nessa área, tinha passado os últimos três anos estudando o ensino da língua inglesa e suas maravilhas. Queria mesmo fazer um curso de literatura, bem gostoso, que desse asas à minha imaginação e quem sabe até me fizesse voltar a escrever, hábito que havia abandonado pela pura e simples falta de inspiração. Queria conhecer a terra de tia Beth, ver de perto lugares e pessoas que só conhecia pelo Google e pela televisão. Queria saber das coisas pra contar pros meus alunos "isso é verdade, mas aquilo lá é a maior balela que eu sei". Acima de tudo, queria viver uma outra vida pra dar valor à minha. Queria dobrar minha situação atual com cuidado maternal e guardá-la dentro de uma gaveta bem quentinha, dizer pra ela "peraí que mamãe vai ali e já volta" e entrar numa bolha mágica que me levaria a um mundo louco e desconhecido... OK, desce da nuvem e vem contar a história, Amâncio! Foco... O problema é que precisava de um curso de três meses, e os cursos de literatura duravam duas semanas. Oops, flashback: como Marinão - apelidos de faculdade reinam! - iria ficar em Londres até dezembro e eu teria que trabalhar até julho, meu plano era ir em agosto, fazer um curso de três meses pra poder trabalhar também nesse período, e viajar pelas redondezas no quarto mês - coitada... pessoas tapadas também têm o direito de fazer planos, mesmo que eles estejam predestinados a dar errado dada a estupidez de sua natureza. Flashforward: no pounds = no trip WHATSOEVER. Acabei encontrando um curso de Business English, que se encaixou muito bem nas justificativas necessárias para minha viagem. "É uma área em crescimento no Brasil, o curso será muitíssimo favorável para minha carreira, contará muitos pontos no meu currículo", e por aí vai. Pedi pra ficar num bairro legal - consegui uma escola e uma casa na região de Hampstead, um lugar sensacional! - e já fui dando entrada no processo. Tudo que eu tinha que fazer era sair dali, deixar aquela menina belo horizontina atleticana professora de inglês aspirante a bailarina namorada do Bruno bem mal-humoradinha de molho por um tempo. De repente ser eu já não era mais tão interessante. O mais interessante, por outro lado, foi perceber como as coisas se desenvolveram rápido. Anunciei meu carro e vendi em menos de uma semana. Recebi meio salário extra na festa de fim de semestre do trabalho, fui pro Rio tirar o visto e consegui minha permissão de trabalho sem problema. Em um mês estava com tudo pronto. Quem não botava fé - no caso todo mundo que eu conhecia - horrorizou. A ficha da minha mãe só caiu quando eu liguei pra ela de lá. Meus amigos acho que pensaram que eu tava logo ali e voltava já. O Bruno me deu muito apoio e sofreu uma arritmia cardíaca um mês depois da minha viagem, em setembro. Coincidência ou não, foi muito punk encarar essa sozinha, com pouca grana, na casa de Madame Satã e pra completar me recuperando de uma gripe devastadora. Fico falando da casa de Madame Satã como se tivesse sido o próprio pesadelo, mas ela foi providencial em vários aspectos. Ao fechar o contrato, me matriculei na escola, paguei as passagens e me perguntaram se eu gostaria de fechar também um tempo de acomodação. Paguei por quatro semanas, tempo a meu ver suficiente pra conhecer outras pessoas na escola e conseguir uma acomodação mais barata, e esse foi um dos meus pouquíssimos insights positivos. Foi minha salvação. Meus três amigos que estavam em Londres - Marinão, Germano e Leo - moravam cada um em um lugar diferente, todos longe da minha escola, e todos no apertamento, dividindo a casa com um mulão - o Leo que o diga. Sabia que se a coisa apertasse eu poderia me apertar com eles, mas num lugar maluco como essa cidade, mais um é tipo mais quinze preocupações. Com Madame Satã, eu tinha um café da manhã e um quarto de princesa só pra mim, com uma caminha bem gostosa e bem quentinha. Isso, claro, sem falar dos meus amigos singulares Lucy, Katerina, Olivier e Andrea. O único problema, além do preço, era o fato de só haver um banheiro pra umas sete pessoas. Detalhe pessoal: de 7.00 às 7.30 o banheiro era de uso exclusivo da "família", como já dizia um dos bilhetinhos nazi. Eu faço xixi o tempo todo. Mesmo. Não sei por quê, mas é assim. Vou ao banheiro umas quatro vezes por noite. Isso significa que diariamente eu passava mal nesse horário. COMO É QUE VOCÊ VAI SE PROGRAMAR PRA FICAR UMA HORA INTEIRA SEM FAZER XIXI? Depois ainda teve o lance da "falta d'água direcionada", mas isso foi bem mais adiante. O importante é ressaltar que garantir uma moradia antes de ir não é só uma tranquilidade a mais - é crucial enquanto você se adapta à cidade e vai se inteirando sobre o necessário. Em meio a algumas sacadas inteligentes e diversas idéias muito furadas, agilizei minha viagem. Só queria sair, respirar outro ar, ser outra pessoa por um momento, tão sufocada eu estava pela minha própria mediocridade. Depois de tudo pronto, pago e decidido, o consultor educacional, um cara extremamente tranquilo e sensato, sentou-se comigo pra dar algumas dicas finais. Ele me explicou sobre o Oyster, sobre a cidade, me contou a sua experiência. Falamos sobre possíveis empregos, currículo, atrações e curiosidades. Senti que ele estava guardando a pérola para o final da conversa. Com a mesma postura tranquila e sensata, ele me disse uma coisa que poderia até ter soado meio clichê, se não tivesse me tocado tanto e tão profundamente. O recado foi simples: não se esqueça de quem você é. Num outro ambiente, tão diferente do nosso, onde ninguém nos conhece, a gente pode se reinventar, ser o que quiser. A gente entra de cabeça naquele mundo de sonho, de fantasia, e um dia não entende mais o que é verdade, não se lembra mais do que ficou naquela gaveta quentinha. Sei que há os que almejam exatamente isso, mas não eu. Eu queria voltar. Queria parar em frente à gavetinha e tocá-la com sabedoria. Queria ter a chance de refletir sobre quem eu era, e fazer de cada episódio uma oportunidade de ser melhor para mim e para o mundo à minha volta. De coração. ... Percebi naquele momento o meu objetivo, e não me esqueci. Chorei quando tive vontade, caí e me levantei quando deu pra levantar, quando achei que era hora. Ouvi muito, recebi todos os tipos de afeto. Convivi com pessoas que me ensinaram tanto... Aprendi que aprimorar é uma palavra dura, tão contínua quanto incompleta, profunda e rasa. Cega, enfurecedora... ingrata de tão plausível. Diária. Peguei o pó do que aprendi e soprei dentro daquela mesma gaveta. Tirei de lá a colcha da minha essência e ela brilhava. Sabia que havia o risco daquele pozinho se soltar aos poucos, desprender-se de mim a cada lavagem. Fiquei feliz; certa de que o que permanecesse tornaria-se evidência de um ser em constante evolução. (Diga-se de passagem, a minha voz continua a mesma, mas as minhas viagens... quanta diferença!) ;) A presto, amici!

Capítulo 18: Que rei sou eu?

Pois é, gente, acho que não podia continuar essa saga sem tocar em um ponto muito importante - talvez o mais importante pra mim. Antes de viajar, digamos que minha vida não estava lá aquela maravilha em nenhum quesito. Com isso, só precisei de um email da minha amiga Marina, que já se encontrava do outro lado do oceano, pra mergulhar de corpo e alma nessa empreitada. Como minha amiga estava um bocado ocupada por lá - e só quando cheguei em Londres vi que não há realmente outra opção viável - resolvi ir a uma agência especializada pra agilizar tudo. Escolhi bem. A primeira pergunta que me fizeram ao chegar foi: o que exatamente você quer fazer em Londres? Estudar e, se possível, trabalhar também. Fácil, né? As respostas sempre na ponta da língua. Você é professora de inglês... o curso seria nessa área? Não queria fazer nada nessa área, tinha passado os últimos três anos estudando o ensino da língua inglesa e suas maravilhas. Queria mesmo fazer um curso de literatura, bem gostoso, que desse asas à minha imaginação e quem sabe até me fizesse voltar a escrever, hábito que havia abandonado pela pura e simples falta de inspiração. Queria conhecer a terra de tia Beth, ver de perto lugares e pessoas que só conhecia pelo Google e pela televisão. Queria saber das coisas pra contar pros meus alunos "isso é verdade, mas aquilo lá é a maior balela que eu sei". Acima de tudo, queria viver uma outra vida pra dar valor à minha. Queria dobrar minha situação atual com cuidado maternal e guardá-la dentro de uma gaveta bem quentinha, dizer pra ela "peraí que mamãe vai ali e já volta" e entrar numa bolha mágica que me levaria a um mundo louco e desconhecido... OK, desce da nuvem e vem contar a história, Amâncio! Foco... O problema é que precisava de um curso de três meses, e os cursos de literatura duravam duas semanas. Oops, flashback: como Marinão - apelidos de faculdade reinam! - iria ficar em Londres até dezembro e eu teria que trabalhar até julho, meu plano era ir em agosto, fazer um curso de três meses pra poder trabalhar também nesse período, e viajar pelas redondezas no quarto mês - coitada... pessoas tapadas também têm o direito de fazer planos, mesmo que eles estejam predestinados a dar errado dada a estupidez de sua natureza. Flashforward: no pounds = no trip WHATSOEVER. Acabei encontrando um curso de Business English, que se encaixou muito bem nas justificativas necessárias para minha viagem. "É uma área em crescimento no Brasil, o curso será muitíssimo favorável para minha carreira, contará muitos pontos no meu currículo", e por aí vai. Pedi pra ficar num bairro legal - consegui uma escola e uma casa na região de Hampstead, um lugar sensacional! - e já fui dando entrada no processo. Tudo que eu tinha que fazer era sair dali, deixar aquela menina belo horizontina atleticana professora de inglês aspirante a bailarina namorada do Bruno bem mal-humoradinha de molho por um tempo. De repente ser eu já não era mais tão interessante. O mais interessante, por outro lado, foi perceber como as coisas se desenvolveram rápido. Anunciei meu carro e vendi em menos de uma semana. Recebi meio salário extra na festa de fim de semestre do trabalho, fui pro Rio tirar o visto e consegui minha permissão de trabalho sem problema. Em um mês estava com tudo pronto. Quem não botava fé - no caso todo mundo que eu conhecia - horrorizou. A ficha da minha mãe só caiu quando eu liguei pra ela de lá. Meus amigos acho que pensaram que eu tava logo ali e voltava já. O Bruno me deu muito apoio e sofreu uma arritmia cardíaca um mês depois da minha viagem, em setembro. Coincidência ou não, foi muito punk encarar essa sozinha, com pouca grana, na casa de Madame Satã e pra completar me recuperando de uma gripe devastadora. Fico falando da casa de Madame Satã como se tivesse sido o próprio pesadelo, mas ela foi providencial em vários aspectos. Ao fechar o contrato, me matriculei na escola, paguei as passagens e me perguntaram se eu gostaria de fechar também um tempo de acomodação. Paguei por quatro semanas, tempo a meu ver suficiente pra conhecer outras pessoas na escola e conseguir uma acomodação mais barata, e esse foi um dos meus pouquíssimos insights positivos. Foi minha salvação. Meus três amigos que estavam em Londres - Marinão, Germano e Leo - moravam cada um em um lugar diferente, todos longe da minha escola, e todos no apertamento, dividindo a casa com um mulão - o Leo que o diga. Sabia que se a coisa apertasse eu poderia me apertar com eles, mas num lugar maluco como essa cidade, mais um é tipo mais quinze preocupações. Com Madame Satã, eu tinha um café da manhã e um quarto de princesa só pra mim, com uma caminha bem gostosa e bem quentinha. Isso, claro, sem falar dos meus amigos singulares Lucy, Katerina, Olivier e Andrea. O único problema, além do preço, era o fato de só haver um banheiro pra umas sete pessoas. Detalhe pessoal: de 7.00 às 7.30 o banheiro era de uso exclusivo da "família", como já dizia um dos bilhetinhos nazi. Eu faço xixi o tempo todo. Mesmo. Não sei por quê, mas é assim. Vou ao banheiro umas quatro vezes por noite. Isso significa que diariamente eu passava mal nesse horário. COMO É QUE VOCÊ VAI SE PROGRAMAR PRA FICAR UMA HORA INTEIRA SEM FAZER XIXI? Depois ainda teve o lance da "falta d'água direcionada", mas isso foi bem mais adiante. O importante é ressaltar que garantir uma moradia antes de ir não é só uma tranquilidade a mais - é crucial enquanto você se adapta à cidade e vai se inteirando sobre o necessário. Em meio a algumas sacadas inteligentes e diversas idéias muito furadas, agilizei minha viagem. Só queria sair, respirar outro ar, ser outra pessoa por um momento, tão sufocada eu estava pela minha própria mediocridade. Depois de tudo pronto, pago e decidido, o consultor educacional, um cara extremamente tranquilo e sensato, sentou-se comigo pra dar algumas dicas finais. Ele me explicou sobre o Oyster, sobre a cidade, me contou a sua experiência. Falamos sobre possíveis empregos, currículo, atrações e curiosidades. Senti que ele estava guardando a pérola para o final da conversa. Com a mesma postura tranquila e sensata, ele me disse uma coisa que poderia até ter soado meio clichê, se não tivesse me tocado tanto e tão profundamente. O recado foi simples: não se esqueça de quem você é. Num outro ambiente, tão diferente do nosso, onde ninguém nos conhece, a gente pode se reinventar, ser o que quiser. A gente entra de cabeça naquele mundo de sonho, de fantasia, e um dia não entende mais o que é verdade, não se lembra mais do que ficou naquela gaveta quentinha. Sei que há os que almejam exatamente isso, mas não eu. Eu queria voltar. Queria parar em frente à gavetinha e tocá-la com sabedoria. Queria ter a chance de refletir sobre quem eu era, e fazer de cada episódio uma oportunidade de ser melhor para mim e para o mundo à minha volta. De coração. ... Percebi naquele momento o meu objetivo, e não me esqueci. Chorei quando tive vontade, caí e me levantei quando deu pra levantar, quando achei que era hora. Ouvi muito, recebi todos os tipos de afeto. Convivi com pessoas que me ensinaram tanto... Aprendi que aprimorar é uma palavra dura, tão contínua quanto incompleta, profunda e rasa. Cega, enfurecedora... ingrata de tão plausível. Diária. Peguei o pó do que aprendi e soprei dentro daquela mesma gaveta. Tirei de lá a colcha da minha essência e ela brilhava. Sabia que havia o risco daquele pozinho se soltar aos poucos, desprender-se de mim a cada lavagem. Fiquei feliz; certa de que o que permanecesse tornaria-se evidência de um ser em constante evolução. (Diga-se de passagem, a minha voz continua a mesma, mas as minhas viagens... quanta diferença!) ;) A presto, amici!

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Mario!!!

Hoje acordei com um sentimento de que a vida é um jogo de vídeo game em tempo real. Se você achar que abriu o olho e apareceu em uma nova fase, tem que se virar, tem que sobreviver, tem que fazer o que tiver que fazer pra pegar todas as bonificações, os prêmios, as vidas extras, aproveitar as deixas, nadar no frio, respirar fundo e ler cada mensagem com paciência, pra entender o que fazer depois. Se cair, caiu - levante-se e continue a jornada, não se engane porque não há outra saída. E se morrer... aí é aquela velha história: agarre-se àquela vidinha extra, espere pra ressucitar e use a experiência pra aproveitar ao máximo o seu momento. Só não fique muito excitado depois de comer aquele cogumelo mágico e grite que nem Deus afunda esse navio, porque aí, meu amigo, já sabemos o que acontece...

Mario!!!

Hoje acordei com um sentimento de que a vida é um jogo de vídeo game em tempo real. Se você achar que abriu o olho e apareceu em uma nova fase, tem que se virar, tem que sobreviver, tem que fazer o que tiver que fazer pra pegar todas as bonificações, os prêmios, as vidas extras, aproveitar as deixas, nadar no frio, respirar fundo e ler cada mensagem com paciência, pra entender o que fazer depois. Se cair, caiu - levante-se e continue a jornada, não se engane porque não há outra saída. E se morrer... aí é aquela velha história: agarre-se àquela vidinha extra, espere pra ressucitar e use a experiência pra aproveitar ao máximo o seu momento. Só não fique muito excitado depois de comer aquele cogumelo mágico e grite que nem Deus afunda esse navio, porque aí, meu amigo, já sabemos o que acontece...

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Purple haze

Quando ele disse que não queria mais, ela levantou-se e saiu. Muda. Calma. Sílvia. Sílvia, ele gritou. Só quem não sonha dá as costas, ele bradou vermelho, tenso. Descompassado. Ela interrompeu a caminhada. Virou-se e sorriu. Eu não te quero mais porque te amo, Sílvia, por que te amo tanto... Por que o amor pra mim é assim: se bater o coração não tem jeito. Ela arrumou o cabelo, piscou longamente. Você entende o que eu sinto? O ardor na minha pele só de olhar pra você? Me olhe, olhe esse descontrole, meu desespero. SÍLVIA! Ela limpou o pigarro da garganta, covinha à mostra. Mas não falou. Pôs as mãos nos bolsos. Respirou fundo. Olhava o agora ex-companheiro com curiosidade. Por tanto tempo você foi o meu sonho, Sílvia, por quanto tempo te pensei e te quis, ah, como te desejei! Sabia de cor cada um dos seus sorrisos, todos os seus penteados. E você... você... nem sabia que eu existia, nem me notava! Por que agora? Por que é que de repente você me olhou e me quis? Esse tipo de coisa não acontece de repente, depois de tanto, tanto... Sílvia, eu duvido que você me ame. Eu te quis tanto, por tanto tempo, que agora que você me quer não faz sentido. Não entendo. Não aceito. Não tem condição você decidir a me amar assim, de uma hora pra outra. Será que você acordou um belo dia e pensou Puxa, mas não é que esse cara é até interessante? Você não me ama, não, Sílvia. Mas eu sim. EU... eu te amo. Te amo tanto que tenho vontade de te matar. Sempre que estamos juntos penso nisso. Sinceramente, Sílvia, já que chegamos a esse ponto, tenho mesmo que dizer. Se continuarmos juntos eu vou te matar. Por isso preciso te proteger, preciso te deixar, você entende? Ela assistia a tudo impassível. Que espetáculo! E o pior, o pior é que agora não consigo mais tirar isso de mim. Não consigo mais tirar você da minha vida, e com isso nunca vou deixá-la viver a sua. Não consigo sequer imaginar outra pessoa te tocando, não é possível. É isso. Ou eu te mato agora... ou vou ter que me matar. Case-se comigo. É nossa única saída. Sílvia deu uma risada. É o pedido de casamento mais engraçado que eu já vi! Beijou o namorado. Você não tem jeito... Pegou-o pela mão e atravessaram a praça da Liberdade, rumo ao cinema. Sempre muito descontraído, ele ainda teve tempo de afrouxar o durex das costas e desfazer-se do punhal pelo caminho.

Purple haze

Quando ele disse que não queria mais, ela levantou-se e saiu. Muda. Calma. Sílvia. Sílvia, ele gritou. Só quem não sonha dá as costas, ele bradou vermelho, tenso. Descompassado. Ela interrompeu a caminhada. Virou-se e sorriu. Eu não te quero mais porque te amo, Sílvia, por que te amo tanto... Por que o amor pra mim é assim: se bater o coração não tem jeito. Ela arrumou o cabelo, piscou longamente. Você entende o que eu sinto? O ardor na minha pele só de olhar pra você? Me olhe, olhe esse descontrole, meu desespero. SÍLVIA! Ela limpou o pigarro da garganta, covinha à mostra. Mas não falou. Pôs as mãos nos bolsos. Respirou fundo. Olhava o agora ex-companheiro com curiosidade. Por tanto tempo você foi o meu sonho, Sílvia, por quanto tempo te pensei e te quis, ah, como te desejei! Sabia de cor cada um dos seus sorrisos, todos os seus penteados. E você... você... nem sabia que eu existia, nem me notava! Por que agora? Por que é que de repente você me olhou e me quis? Esse tipo de coisa não acontece de repente, depois de tanto, tanto... Sílvia, eu duvido que você me ame. Eu te quis tanto, por tanto tempo, que agora que você me quer não faz sentido. Não entendo. Não aceito. Não tem condição você decidir a me amar assim, de uma hora pra outra. Será que você acordou um belo dia e pensou Puxa, mas não é que esse cara é até interessante? Você não me ama, não, Sílvia. Mas eu sim. EU... eu te amo. Te amo tanto que tenho vontade de te matar. Sempre que estamos juntos penso nisso. Sinceramente, Sílvia, já que chegamos a esse ponto, tenho mesmo que dizer. Se continuarmos juntos eu vou te matar. Por isso preciso te proteger, preciso te deixar, você entende? Ela assistia a tudo impassível. Que espetáculo! E o pior, o pior é que agora não consigo mais tirar isso de mim. Não consigo mais tirar você da minha vida, e com isso nunca vou deixá-la viver a sua. Não consigo sequer imaginar outra pessoa te tocando, não é possível. É isso. Ou eu te mato agora... ou vou ter que me matar. Case-se comigo. É nossa única saída. Sílvia deu uma risada. É o pedido de casamento mais engraçado que eu já vi! Beijou o namorado. Você não tem jeito... Pegou-o pela mão e atravessaram a praça da Liberdade, rumo ao cinema. Sempre muito descontraído, ele ainda teve tempo de afrouxar o durex das costas e desfazer-se do punhal pelo caminho.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Nosso mundo

Não sei você, mas eu tenho coragem. Coragem de me despir e olhar no espelho, coragem de sentir-me bem inclusive quando estou no vermelho. Não sei você, mas eu tenho medo. Medo de envelhecer por arrepender, medo de quem vou encontrar quando morrer, do que inevitavelmente há de ser. Sei que você tem medo de mim e que falta coragem pra dizer. Eu? Não, não tenho medo de você. Não me aflige sua confusão constante. Não temo seu bom humor itinerante. Não finjo não perceber o barulho do seu coração ao me enxergar correndo, vivendo, o seu pensar pulsante. Não fico às voltas com nenhum dos seus desalentos, nem me preocupam seus sorrateiros, vulgares de tão simples... tormentos. Entretanto, tenho medo da minha coragem de te dedicar cada um dos meus sentimentos... Em sonhos curtos, em devaneios lívidos, em horários e locais fora do tempo, lá te alimento, sem dor, sem pudor, sem qualquer outro pensamento - cheia de coragem provocada pelo medo de insistir em te abrigar no meu momento... Que merda! Não sei você, mas eu tenho medo é da minha coragem de te querer.

Nosso mundo

Não sei você, mas eu tenho coragem. Coragem de me despir e olhar no espelho, coragem de sentir-me bem inclusive quando estou no vermelho. Não sei você, mas eu tenho medo. Medo de envelhecer por arrepender, medo de quem vou encontrar quando morrer, do que inevitavelmente há de ser. Sei que você tem medo de mim e que falta coragem pra dizer. Eu? Não, não tenho medo de você. Não me aflige sua confusão constante. Não temo seu bom humor itinerante. Não finjo não perceber o barulho do seu coração ao me enxergar correndo, vivendo, o seu pensar pulsante. Não fico às voltas com nenhum dos seus desalentos, nem me preocupam seus sorrateiros, vulgares de tão simples... tormentos. Entretanto, tenho medo da minha coragem de te dedicar cada um dos meus sentimentos... Em sonhos curtos, em devaneios lívidos, em horários e locais fora do tempo, lá te alimento, sem dor, sem pudor, sem qualquer outro pensamento - cheia de coragem provocada pelo medo de insistir em te abrigar no meu momento... Que merda! Não sei você, mas eu tenho medo é da minha coragem de te querer.