quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Brave heart

Essa frase é muito importante pra mim, e queria que ela fosse também, do fundo do coração, pra vocês:
"Emancipate yourselves from mental slavery"
Não deixem jamais que alguém, seja lá quem for, tente lhes tirar esse bem tão precioso que é o livre pensar. É ele que gera estratégia, é ele que gera ação efetiva - é dele que nasce aquele pontinho pequeno e obstinado chamado revolução. Pensar nos dá asas para ir ao céu e ver o mundo de cima, como o Happy Prince de Wilde; traz a oportunidade de ampliarmos nossa existência ao provarmos desse e daquele sentimento.
Desejo a todos uma cabeça boa pra pensar e um coração saudável pra processar com sabedoria e humildade cada um desses inúmeros pensamentos...
Auguri!

Brave heart

Essa frase é muito importante pra mim, e queria que ela fosse também, do fundo do coração, pra vocês:
"Emancipate yourselves from mental slavery"
Não deixem jamais que alguém, seja lá quem for, tente lhes tirar esse bem tão precioso que é o livre pensar. É ele que gera estratégia, é ele que gera ação efetiva - é dele que nasce aquele pontinho pequeno e obstinado chamado revolução. Pensar nos dá asas para ir ao céu e ver o mundo de cima, como o Happy Prince de Wilde; traz a oportunidade de ampliarmos nossa existência ao provarmos desse e daquele sentimento.
Desejo a todos uma cabeça boa pra pensar e um coração saudável pra processar com sabedoria e humildade cada um desses inúmeros pensamentos...
Auguri!

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Sonho de uma noite de verão

Foi num sábado abafado e calorento. Subia o morro para chegar em casa, depois de seis horas trabalhando sem parar. Da minha testa pingava suor. Minha pasta pesava uma tonelada e eu me fixava em uma única necessidade: a de abrir a porta, jogar aquele tijolo no chão e entrar debaixo da água gelada. Pode ser realmente escaldante em dezembro, concluiu minha massa mole que se arrastava pelo passeio desnivelado. Calor. Cansaço. Fome. Raiva! Mas não, não, nada de desvirtuar o pensamento daquela aguinha gostosa esfriando aos poucos meu corpo quente, carregando consigo aquele suor impregnado, refrescando a carne... Como num passe de mágica lá estava eu, chave na mão, olhos pequenos, sorriso estúpido no rosto. Abri a porta e quase tive um ataque do coração ali mesmo. De trás de cada móvel foi surgindo uma sombra, tudo muito rápido, tudo ao mesmo tempo. Na penumbra, não via nada com clareza. Acendi a luz e a multidão acalorada que agora tomava conta da minha sala gritou "surpresa!". Olhava para meus móveis de forma a me certificar que aquela era realmente a minha casa. Mas como, quem tem a ch.... Não precisei concluir meu pensamento. Gilda. Da cozinha ela vinha, rebolenta e pintada como uma chacrete, segurando um bolo cheio de velas. Vinha sorridente, pediu inclusive para apagarem a luz, e seus olhos brilhavam de satisfação por ser a dona da idéia, a anfitriã da festa. Com chapeuzinhos e línguas-de-sogra, os convidados, sujeitos cujo telefone estava anotado em uma agenda de 1983 - entre eles uma tia doente que só sai de casa em ocasiões festivas -, se organizaram em volta da mesa e sem demora iniciaram a cantoria. Cantaram o big, o com quem será, e outro parabéns porque o fogueteiro acabara de chegar. Como eu não soprava as velas, alguns dos presentes começaram a me questionar. Gritos de "sopra" foram emergindo, até gritarem todos em uníssono, com os punhos fechados e os braços para cima, como num show de rock ou um jogo de futebol. Gilda aproximou-se. Passou o braço em volta da minha cintura e falou bem mimosa ao meu ouvido "Sopra as velinhas, meu amor, sopra". Esperei a comoção terminar e, sem alterar o tom de voz, olhei para todos, a seguir para Gilda, e disse "hoje é aniversário do seu ex-marido Paulo Ricardo, Gilda; o meu é em maio". Silêncio. Puro e absoluto. Todos me olhavam incrédulos, boca aberta, olhos esbugalhados. Gilda não conseguia dizer palavra, o corpo paralisado, a face lívida. Fui tomado por um desejo incontrolável de rir-me daquele espetáculo patético. Minha gargalhada saiu de repente, ácida e sonora. Um a um, os presentes começaram a rir também, e pude ouvir alguns suspirando aliviados: "puxa, esse Roberto... quase caí nessa!". Ligaram o som, trouxeram a bebida e caíram na farra. Fui tomar meu merecido banho e por lá fiquei, mas minha ausência definitivamente não foi problema para que a festa fosse realmente de arromba - foi até as cinco da manhã. No dia seguinte o porteiro me felicitou animado, e ainda teve tempo de dizer que uma certa senhora deve ter exagerado no salgadinho, porque saiu logo depois dos parabéns, cambaleando e branca como um fantasma.   

Sonho de uma noite de verão

Foi num sábado abafado e calorento. Subia o morro para chegar em casa, depois de seis horas trabalhando sem parar. Da minha testa pingava suor. Minha pasta pesava uma tonelada e eu me fixava em uma única necessidade: a de abrir a porta, jogar aquele tijolo no chão e entrar debaixo da água gelada. Pode ser realmente escaldante em dezembro, concluiu minha massa mole que se arrastava pelo passeio desnivelado. Calor. Cansaço. Fome. Raiva! Mas não, não, nada de desvirtuar o pensamento daquela aguinha gostosa esfriando aos poucos meu corpo quente, carregando consigo aquele suor impregnado, refrescando a carne... Como num passe de mágica lá estava eu, chave na mão, olhos pequenos, sorriso estúpido no rosto. Abri a porta e quase tive um ataque do coração ali mesmo. De trás de cada móvel foi surgindo uma sombra, tudo muito rápido, tudo ao mesmo tempo. Na penumbra, não via nada com clareza. Acendi a luz e a multidão acalorada que agora tomava conta da minha sala gritou "surpresa!". Olhava para meus móveis de forma a me certificar que aquela era realmente a minha casa. Mas como, quem tem a ch.... Não precisei concluir meu pensamento. Gilda. Da cozinha ela vinha, rebolenta e pintada como uma chacrete, segurando um bolo cheio de velas. Vinha sorridente, pediu inclusive para apagarem a luz, e seus olhos brilhavam de satisfação por ser a dona da idéia, a anfitriã da festa. Com chapeuzinhos e línguas-de-sogra, os convidados, sujeitos cujo telefone estava anotado em uma agenda de 1983 - entre eles uma tia doente que só sai de casa em ocasiões festivas -, se organizaram em volta da mesa e sem demora iniciaram a cantoria. Cantaram o big, o com quem será, e outro parabéns porque o fogueteiro acabara de chegar. Como eu não soprava as velas, alguns dos presentes começaram a me questionar. Gritos de "sopra" foram emergindo, até gritarem todos em uníssono, com os punhos fechados e os braços para cima, como num show de rock ou um jogo de futebol. Gilda aproximou-se. Passou o braço em volta da minha cintura e falou bem mimosa ao meu ouvido "Sopra as velinhas, meu amor, sopra". Esperei a comoção terminar e, sem alterar o tom de voz, olhei para todos, a seguir para Gilda, e disse "hoje é aniversário do seu ex-marido Paulo Ricardo, Gilda; o meu é em maio". Silêncio. Puro e absoluto. Todos me olhavam incrédulos, boca aberta, olhos esbugalhados. Gilda não conseguia dizer palavra, o corpo paralisado, a face lívida. Fui tomado por um desejo incontrolável de rir-me daquele espetáculo patético. Minha gargalhada saiu de repente, ácida e sonora. Um a um, os presentes começaram a rir também, e pude ouvir alguns suspirando aliviados: "puxa, esse Roberto... quase caí nessa!". Ligaram o som, trouxeram a bebida e caíram na farra. Fui tomar meu merecido banho e por lá fiquei, mas minha ausência definitivamente não foi problema para que a festa fosse realmente de arromba - foi até as cinco da manhã. No dia seguinte o porteiro me felicitou animado, e ainda teve tempo de dizer que uma certa senhora deve ter exagerado no salgadinho, porque saiu logo depois dos parabéns, cambaleando e branca como um fantasma.   

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

FEAR=LESS

I can still smile to you
I can still laugh at you
I can still remember you
as someone who loved me too -
I walk fearless through your lies
seeking for a piece of truth.

FEAR=LESS

I can still smile to you
I can still laugh at you
I can still remember you
as someone who loved me too -
I walk fearless through your lies
seeking for a piece of truth.

J’ACUSE !!!

J’ACUSE !!!

(Eu acuso!)

(Tributo ao professor Kássio Vinícius Castro Gomes)

« Mon devoir est de parler, je ne veux pas être complice.

(Émile Zola)

Meu dever é falar, não quero ser cúmplice. (...)

(Émile Zola)

Foi uma tragédia fartamente anunciada. Em milhares de casos, desrespeito. Em outros tantos, escárnio. Em Belo Horizonte, um estudante processa a escola e o professor que lhe deu notas baixas, alegando que teve danos morais ao ter que virar noites estudando para a prova subsequente. (Notem bem: o alegado “dano moral” do estudante foi ter que... estudar!). A coisa não fica apenas por aí. Pelo Brasil afora, ameaças constantes. Ainda neste ano, uma professora brutalmente espancada por um aluno. O ápice desta escalada macabra não poderia ser outro. O professor Kássio Vinícius Castro Gomes pagou com sua vida, com seu futuro, com o futuro de sua esposa e filhas, com as lágrimas eternas de sua mãe, pela irresponsabilidade que há muito vem tomando conta dos ambientes escolares. Há uma lógica perversa por trás dessa asquerosa escalada. A promoção do desrespeito aos valores, ao bom senso, às regras de bem viver e à autoridade foi elevada a método de ensino e imperativo de convivência supostamente democrática. No início, foi o maio de 68, em Paris: gritava-se nas ruas que “era proibido proibir”. Depois, a geração do “não bate, que traumatiza”. A coisa continuou: “Não reprove, que atrapalha”. Não dê provas difíceis, pois “temos que respeitar o perfil dos nossos alunos”. Aliás, “prova não prova nada”. Deixe o aluno “construir seu conhecimento.” Não vamos avaliar o aluno. Pensando bem, “é o aluno que vai avaliar o professor”. Afinal de contas, ele está pagando... E como a estupidez humana não tem limite, a avacalhação geral epidêmica, travestida de “novo paradigma” (Irc!), prosseguiu a todo vapor, em vários setores: “o bandido é vítima da sociedade”, “temos que mudar ‘tudo isso que está aí’; “mais importante que ter conhecimento é ser ‘crítico’.” Claro que a intelectualidade rasa de pedagogos de panfleto e burocratas carreiristas ganhou um imenso impulso com a mercantilização desabrida do ensino: agora, o discurso anti-disciplina é anabolizado pela lógica doentia e desonesta da paparicação ao aluno–cliente... Estamos criando gerações em que uma parcela considerável de nossos cidadãos é composta de adultos mimados, despreparados para os problemas, decepções e desafios da vida, incapazes de lidar com conflitos e, pior, dotados de uma delirante certeza de que “o mundo lhes deve algo”. Um desses jovens, revoltado com suas notas baixas, cravou uma faca com dezoito centímetros de lâmina, bem no coração de um professor. Tirou-lhe tudo o que tinha e tudo o que poderia vir a ter, sentir, amar.



Ao assassino, corretamente , deverão ser concedidos todos os direitos que a lei prevê: o direito ao tratamento humano, o direito à ampla defesa, o direito de não ser condenado em pena maior do que a prevista em lei. Tudo isso, e muito mais, fará parte do devido processo legal, que se iniciará com a denúncia, a ser apresentada pelo Ministério Público. A acusação penal ao autor do homicídio covarde virá do promotor de justiça. Mas, com a licença devida ao célebre texto de Emile Zola, EU ACUSO tantos outros que estão por trás do cabo da faca:



EU ACUSO a pedagogia ideologizada, que pretende relativizar tudo e todos, equiparando certo ao errado e vice-versa;

EU ACUSO os pseudo-intelectuais de panfleto, que romantizam a “revolta dos oprimidos” e justificam a violência por parte daqueles que se sentem vítimas;

EU ACUSO os burocratas da educação e suas cartilhas do politicamente correto, que impedem a escola de constar faltas graves no histórico escolar, mesmo de alunos criminosos, deixando-os livres para tumultuar e cometer crimes em outras escolas;

EU ACUSO a hipocrisia de exigir professores com mestrado e doutorado, muitos dos quais, no dia a dia, serão pressionados a dar provas bem tranqüilas, provas de mentirinha, para “adequar a avaliação ao perfil dos alunos”;

EU ACUSO os últimos tantos Ministros da Educação, que em nome de estatísticas hipócritas e interesses privados, permitiram a proliferação de cursos superiores completamente sem condições, freqüentados por alunos igualmente sem condições de ali estar;

EU ACUSO a mercantilização cretina do ensino, a venda de diplomas e títulos sem o mínimo de interesse e de responsabilidade com o conteúdo e formação dos alunos, bem como de suas futuras missões na sociedade;

EU ACUSO a lógica doentia e hipócrita do aluno-cliente, cada vez menos exigido e cada vez mais paparicado e enganado, o qual finge que não sabe que, para a escola que lhe paparica, seu boleto hoje vale muito mais do que seu sucesso e sua felicidade amanhã;

EU ACUSO a hipocrisia das escolas que jamais reprovam seus alunos, as quais formam analfabetos funcionais só para maquiar estatísticas do IDH e dizer ao mundo que o número de alunos com

segundo grau completo cresceu “tantos por cento”;

EU ACUSO os que aplaudem tais escolas e ainda trabalham pela massificação do ensino superior, sem entender que o aluno que ali chega deve ter o mínimo de preparo civilizacional, intelectual e moral, pois estamos chegando ao tempo no qual o aluno “terá direito” de se tornar médico ou advogado sem sequer saber escrever, tudo para o desespero de seus futuros clientes-cobaia;

EU ACUSO os que agora falam em promover um “novo paradigma”, uma “ nova cultura de paz”, pois o que se deve promover é a boa e VELHA cultura da “vergonha na cara”, do respeito às normas, à autoridade e do respeito ao ambiente universitário como um ambiente de busca do conhecimento;

EU ACUSO os “cabeças–boas” que acham e ensinam que disciplina é “careta”, que respeito às normas é coisa de velho decrépito,

EU ACUSO os métodos de avaliação de professores, que se tornaram templos de vendilhões, nos quais votos são comprados e vendidos em troca de piadinhas, sorrisos e notas fáceis;

EU ACUSO os alunos que protestam contra a impunidade dos políticos, mas gabam-se de colar nas provas, assim como ACUSO os professores que, vendo tais alunos colarem, não têm coragem de aplicar a devida punição.

EU VEEMENTEMENTE ACUSO os diretores e coordenadores que impedem os professores de punir os alunos que colam, ou pretendem que os professores sejam “promoters” de seus cursos;

EU ACUSO os diretores e coordenadores que toleram condutas desrespeitosas de alunos contra professores e funcionários, pois sua omissão quanto aos pequenos incidentes é diretamente responsável pela ocorrência dos incidentes maiores;

Uma multidão de filhos tiranos que se tornam alunos-clientes, serão despejados na vida como adultos eternamente infantilizados e totalmente despreparados, tanto tecnicamente para o exercício da profissão, quanto pessoalmente para os conflitos, desafios e decepções do dia a dia. Ensimesmados em seus delírios de perseguição ou de grandeza, estes jovens mostram cada vez menos preparo na delicada e essencial arte que é lidar com aquele ser complexo e imprevisível que podemos chamar de “o outro”. A infantilização eterna cria a seguinte e horrenda lógica, hoje na cabeça de muitas crianças em corpo de adulto: “Se eu tiro nota baixa, a culpa é do professor. Se não tenho dinheiro, a culpa é do patrão. Se me drogo, a culpa é dos meus pais. Se furto, roubo, mato, a culpa é do sistema. Eu, sou apenas uma vítima. Uma eterna vítima. O opressor é você, que trabalha, paga suas contas em dia e vive sua vida. Minhas coisas não saíram como eu queria. Estou com muita

raiva. Quando eu era criança, eu batia os pés no chão. Mas agora, fisicamente, eu cresci. Portanto, você pode ser o próximo.” Qualquer um de nós pode ser o próximo, por qualquer motivo. Em qualquer lugar, dentro ou fora das escolas. A facada ignóbil no professor Kássio dói no peito de todos nós. Que a sua morte não seja em vão. É hora de repensarmos a educação brasileira e abrirmos mão dos modismos e invencionices. A melhor “nova cultura de paz” que podemos adotar nas escolas e universidades é fazermos as pazes com os bons e velhos conceitos de seriedade, responsabilidade, disciplina e estudo de verdade.



Igor Pantuzza Wildmann

Advogado – Doutor em Direito. Professor universitário.

J’ACUSE !!!

J’ACUSE !!!

(Eu acuso!)

(Tributo ao professor Kássio Vinícius Castro Gomes)

« Mon devoir est de parler, je ne veux pas être complice.

(Émile Zola)

Meu dever é falar, não quero ser cúmplice. (...)

(Émile Zola)

Foi uma tragédia fartamente anunciada. Em milhares de casos, desrespeito. Em outros tantos, escárnio. Em Belo Horizonte, um estudante processa a escola e o professor que lhe deu notas baixas, alegando que teve danos morais ao ter que virar noites estudando para a prova subsequente. (Notem bem: o alegado “dano moral” do estudante foi ter que... estudar!). A coisa não fica apenas por aí. Pelo Brasil afora, ameaças constantes. Ainda neste ano, uma professora brutalmente espancada por um aluno. O ápice desta escalada macabra não poderia ser outro. O professor Kássio Vinícius Castro Gomes pagou com sua vida, com seu futuro, com o futuro de sua esposa e filhas, com as lágrimas eternas de sua mãe, pela irresponsabilidade que há muito vem tomando conta dos ambientes escolares. Há uma lógica perversa por trás dessa asquerosa escalada. A promoção do desrespeito aos valores, ao bom senso, às regras de bem viver e à autoridade foi elevada a método de ensino e imperativo de convivência supostamente democrática. No início, foi o maio de 68, em Paris: gritava-se nas ruas que “era proibido proibir”. Depois, a geração do “não bate, que traumatiza”. A coisa continuou: “Não reprove, que atrapalha”. Não dê provas difíceis, pois “temos que respeitar o perfil dos nossos alunos”. Aliás, “prova não prova nada”. Deixe o aluno “construir seu conhecimento.” Não vamos avaliar o aluno. Pensando bem, “é o aluno que vai avaliar o professor”. Afinal de contas, ele está pagando... E como a estupidez humana não tem limite, a avacalhação geral epidêmica, travestida de “novo paradigma” (Irc!), prosseguiu a todo vapor, em vários setores: “o bandido é vítima da sociedade”, “temos que mudar ‘tudo isso que está aí’; “mais importante que ter conhecimento é ser ‘crítico’.” Claro que a intelectualidade rasa de pedagogos de panfleto e burocratas carreiristas ganhou um imenso impulso com a mercantilização desabrida do ensino: agora, o discurso anti-disciplina é anabolizado pela lógica doentia e desonesta da paparicação ao aluno–cliente... Estamos criando gerações em que uma parcela considerável de nossos cidadãos é composta de adultos mimados, despreparados para os problemas, decepções e desafios da vida, incapazes de lidar com conflitos e, pior, dotados de uma delirante certeza de que “o mundo lhes deve algo”. Um desses jovens, revoltado com suas notas baixas, cravou uma faca com dezoito centímetros de lâmina, bem no coração de um professor. Tirou-lhe tudo o que tinha e tudo o que poderia vir a ter, sentir, amar.



Ao assassino, corretamente , deverão ser concedidos todos os direitos que a lei prevê: o direito ao tratamento humano, o direito à ampla defesa, o direito de não ser condenado em pena maior do que a prevista em lei. Tudo isso, e muito mais, fará parte do devido processo legal, que se iniciará com a denúncia, a ser apresentada pelo Ministério Público. A acusação penal ao autor do homicídio covarde virá do promotor de justiça. Mas, com a licença devida ao célebre texto de Emile Zola, EU ACUSO tantos outros que estão por trás do cabo da faca:



EU ACUSO a pedagogia ideologizada, que pretende relativizar tudo e todos, equiparando certo ao errado e vice-versa;

EU ACUSO os pseudo-intelectuais de panfleto, que romantizam a “revolta dos oprimidos” e justificam a violência por parte daqueles que se sentem vítimas;

EU ACUSO os burocratas da educação e suas cartilhas do politicamente correto, que impedem a escola de constar faltas graves no histórico escolar, mesmo de alunos criminosos, deixando-os livres para tumultuar e cometer crimes em outras escolas;

EU ACUSO a hipocrisia de exigir professores com mestrado e doutorado, muitos dos quais, no dia a dia, serão pressionados a dar provas bem tranqüilas, provas de mentirinha, para “adequar a avaliação ao perfil dos alunos”;

EU ACUSO os últimos tantos Ministros da Educação, que em nome de estatísticas hipócritas e interesses privados, permitiram a proliferação de cursos superiores completamente sem condições, freqüentados por alunos igualmente sem condições de ali estar;

EU ACUSO a mercantilização cretina do ensino, a venda de diplomas e títulos sem o mínimo de interesse e de responsabilidade com o conteúdo e formação dos alunos, bem como de suas futuras missões na sociedade;

EU ACUSO a lógica doentia e hipócrita do aluno-cliente, cada vez menos exigido e cada vez mais paparicado e enganado, o qual finge que não sabe que, para a escola que lhe paparica, seu boleto hoje vale muito mais do que seu sucesso e sua felicidade amanhã;

EU ACUSO a hipocrisia das escolas que jamais reprovam seus alunos, as quais formam analfabetos funcionais só para maquiar estatísticas do IDH e dizer ao mundo que o número de alunos com

segundo grau completo cresceu “tantos por cento”;

EU ACUSO os que aplaudem tais escolas e ainda trabalham pela massificação do ensino superior, sem entender que o aluno que ali chega deve ter o mínimo de preparo civilizacional, intelectual e moral, pois estamos chegando ao tempo no qual o aluno “terá direito” de se tornar médico ou advogado sem sequer saber escrever, tudo para o desespero de seus futuros clientes-cobaia;

EU ACUSO os que agora falam em promover um “novo paradigma”, uma “ nova cultura de paz”, pois o que se deve promover é a boa e VELHA cultura da “vergonha na cara”, do respeito às normas, à autoridade e do respeito ao ambiente universitário como um ambiente de busca do conhecimento;

EU ACUSO os “cabeças–boas” que acham e ensinam que disciplina é “careta”, que respeito às normas é coisa de velho decrépito,

EU ACUSO os métodos de avaliação de professores, que se tornaram templos de vendilhões, nos quais votos são comprados e vendidos em troca de piadinhas, sorrisos e notas fáceis;

EU ACUSO os alunos que protestam contra a impunidade dos políticos, mas gabam-se de colar nas provas, assim como ACUSO os professores que, vendo tais alunos colarem, não têm coragem de aplicar a devida punição.

EU VEEMENTEMENTE ACUSO os diretores e coordenadores que impedem os professores de punir os alunos que colam, ou pretendem que os professores sejam “promoters” de seus cursos;

EU ACUSO os diretores e coordenadores que toleram condutas desrespeitosas de alunos contra professores e funcionários, pois sua omissão quanto aos pequenos incidentes é diretamente responsável pela ocorrência dos incidentes maiores;

Uma multidão de filhos tiranos que se tornam alunos-clientes, serão despejados na vida como adultos eternamente infantilizados e totalmente despreparados, tanto tecnicamente para o exercício da profissão, quanto pessoalmente para os conflitos, desafios e decepções do dia a dia. Ensimesmados em seus delírios de perseguição ou de grandeza, estes jovens mostram cada vez menos preparo na delicada e essencial arte que é lidar com aquele ser complexo e imprevisível que podemos chamar de “o outro”. A infantilização eterna cria a seguinte e horrenda lógica, hoje na cabeça de muitas crianças em corpo de adulto: “Se eu tiro nota baixa, a culpa é do professor. Se não tenho dinheiro, a culpa é do patrão. Se me drogo, a culpa é dos meus pais. Se furto, roubo, mato, a culpa é do sistema. Eu, sou apenas uma vítima. Uma eterna vítima. O opressor é você, que trabalha, paga suas contas em dia e vive sua vida. Minhas coisas não saíram como eu queria. Estou com muita

raiva. Quando eu era criança, eu batia os pés no chão. Mas agora, fisicamente, eu cresci. Portanto, você pode ser o próximo.” Qualquer um de nós pode ser o próximo, por qualquer motivo. Em qualquer lugar, dentro ou fora das escolas. A facada ignóbil no professor Kássio dói no peito de todos nós. Que a sua morte não seja em vão. É hora de repensarmos a educação brasileira e abrirmos mão dos modismos e invencionices. A melhor “nova cultura de paz” que podemos adotar nas escolas e universidades é fazermos as pazes com os bons e velhos conceitos de seriedade, responsabilidade, disciplina e estudo de verdade.



Igor Pantuzza Wildmann

Advogado – Doutor em Direito. Professor universitário.

"Deixai que venham a mim as criancinhas"

"As crianças aprendem
aquilo que vivem.
Se uma criança vive criticada,
aprende a condenar.
Se uma criança vive com maus tratos,
aprende a brigar.
Se uma criança vive humilhada,
aprende a se sentir culpada.
Se uma criança é estimulada,
aprende a confiar.
Se uma criança é valorizada,
aprende a valorizar.
Se uma criança vive no equilíbrio,
aprende a ser justa.
Se uma criança vive em segurança,
aprende a ter fé.
Se uma criança é bem aceita,
aprende a respeitar.
Se uma criança vive na amizade,
aprende a ser amiga,
aprende a encontrar o amor no mundo."
(texto retirado de um quadro na sala do meu pediatra, que me atende até hoje)

Essa criança não precisa ser seu filho ou parente. Acolha as crianças, não porque elas são o futuro, mas porque o presente delas é algo muito precioso. Acolha enquanto pai ou mãe, médico ou professor, vizinho ou amigo - enquanto ser humano. Não perpetue sua miséria pessoal. Acolha essas crianças por elas e por você também.

"Deixai que venham a mim as criancinhas"

"As crianças aprendem
aquilo que vivem.
Se uma criança vive criticada,
aprende a condenar.
Se uma criança vive com maus tratos,
aprende a brigar.
Se uma criança vive humilhada,
aprende a se sentir culpada.
Se uma criança é estimulada,
aprende a confiar.
Se uma criança é valorizada,
aprende a valorizar.
Se uma criança vive no equilíbrio,
aprende a ser justa.
Se uma criança vive em segurança,
aprende a ter fé.
Se uma criança é bem aceita,
aprende a respeitar.
Se uma criança vive na amizade,
aprende a ser amiga,
aprende a encontrar o amor no mundo."
(texto retirado de um quadro na sala do meu pediatra, que me atende até hoje)

Essa criança não precisa ser seu filho ou parente. Acolha as crianças, não porque elas são o futuro, mas porque o presente delas é algo muito precioso. Acolha enquanto pai ou mãe, médico ou professor, vizinho ou amigo - enquanto ser humano. Não perpetue sua miséria pessoal. Acolha essas crianças por elas e por você também.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Indignação indigna

Desculpem, mas hoje vou ter que dar uma de dona Edith aqui: como é que a gente vive com tudo no preço que tá? Imaginem a situação de um professor de escola pública no Brasil... Ponderemos que nem todo professor prepara e nem todo aluno xinga, mas a situação chegou a um ponto tal que agora, com todo o trabalho que executa dentro e fora da sala de aula, além do desrespeito dos alunos, da repreensão de pais superprotetores e do descaso das instituições de ensino, o professor teme pela própria vida. Lembro de quando estudava Letras na UFMG e fiz uma disciplina na Faculdade de Educação com alunos de vários cursos - educação física, matemática, química e outros. Em um dado momento foi pedido que compartilhássemos nossas experiências enquanto professores. Alguns colegas da rede pública deram um testemunho de arrepiar. Contaram que já foram ameaçados com facas e revólveres dentro e fora da escola por alunos reprovados ou com faltas; que por incontáveis vezes os vidros de seus carros foram quebrados e pneus foram furados pelos alunos NA PORTA DA ESCOLA. E se vocês forem dar uma olhada no salário desses profissionais, vão ficar sem entender por que eles estudaram quatro anos e assumiram o compromisso de estudarem a vida inteira para enfrentarem esse dia a dia.  Não há status algum em ser professor no nosso país, uma profissão sem a qual nenhuma outra existiria. A concepção de educação no Brasil virou uma piada da qual todos riem sem que ninguém ache graça. Enquanto isso, como diz o outro, a gente se lasca mas se diverte: http://www.youtube.com/watch?v=zQQOzVF_zjs

Indignação indigna

Desculpem, mas hoje vou ter que dar uma de dona Edith aqui: como é que a gente vive com tudo no preço que tá? Imaginem a situação de um professor de escola pública no Brasil... Ponderemos que nem todo professor prepara e nem todo aluno xinga, mas a situação chegou a um ponto tal que agora, com todo o trabalho que executa dentro e fora da sala de aula, além do desrespeito dos alunos, da repreensão de pais superprotetores e do descaso das instituições de ensino, o professor teme pela própria vida. Lembro de quando estudava Letras na UFMG e fiz uma disciplina na Faculdade de Educação com alunos de vários cursos - educação física, matemática, química e outros. Em um dado momento foi pedido que compartilhássemos nossas experiências enquanto professores. Alguns colegas da rede pública deram um testemunho de arrepiar. Contaram que já foram ameaçados com facas e revólveres dentro e fora da escola por alunos reprovados ou com faltas; que por incontáveis vezes os vidros de seus carros foram quebrados e pneus foram furados pelos alunos NA PORTA DA ESCOLA. E se vocês forem dar uma olhada no salário desses profissionais, vão ficar sem entender por que eles estudaram quatro anos e assumiram o compromisso de estudarem a vida inteira para enfrentarem esse dia a dia.  Não há status algum em ser professor no nosso país, uma profissão sem a qual nenhuma outra existiria. A concepção de educação no Brasil virou uma piada da qual todos riem sem que ninguém ache graça. Enquanto isso, como diz o outro, a gente se lasca mas se diverte: http://www.youtube.com/watch?v=zQQOzVF_zjs

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Vida fácil

Já dizia aquele um que o que se leva da vida é conhecimento
que se desperta amor, se cava a própria cova, se planta competência...
Perguntam-me surpresos o que fazem essas luzes pelo meu cabelo
sem entenderem que são uma tentativa de preservar minha essência.
Pensam que os ditados populares ainda vão salvar o mundo?
Então respirem fundo e tentem ao menos reagir a cada fechar de olhos,
a cada pulsar de veias, a cada abrir fugaz de pernas
com alguma originalidade e um mínimo de inteligência.

Vida fácil

Já dizia aquele um que o que se leva da vida é conhecimento
que se desperta amor, se cava a própria cova, se planta competência...
Perguntam-me surpresos o que fazem essas luzes pelo meu cabelo
sem entenderem que são uma tentativa de preservar minha essência.
Pensam que os ditados populares ainda vão salvar o mundo?
Então respirem fundo e tentem ao menos reagir a cada fechar de olhos,
a cada pulsar de veias, a cada abrir fugaz de pernas
com alguma originalidade e um mínimo de inteligência.

domingo, 12 de dezembro de 2010

DIY

A chuva insiste em cair, e eu, embebida em puro ócio, não paro de pensar no quanto as pessoas me fazem mal. Poderia escrever uma mini história sobre uma menina fraca, sempre doente, cansada e triste. Cada vez mais fraca, abatida e preocupada com a opinião de seus superiores, ela consultou vários especialistas do campo prático ao espiritual - tomou muitos remédios, fez passes e simpatias,  participou de rituais, ouviu conselhos, mas nada a curou. Um belo dia a pessoa mais improvável descobriu que quem a enfraquecia eram as pessoas. Os outros para ela eram como um balde de criptonita - quanto mais gente, menos energia. Ela então decidiu afastar-se das pessoas. Fez um protesto sobre o uso do telefone, distribuiu meias respostas e não se deu ao trabalho de fazer qualquer pergunta. Ainda assim, não melhorava. Ficou em dúvida com relação à natureza dessas pessoas, e quis saber se somente os otários, falsos, enxeridos e desocupados tinham um efeito ruim sobre ela. Para tirar a dúvida, foi a um evento na Praça da Liberdade num domingo quente, próximo ao Natal. Um formigueiro; um pesadelo; um show de horror. Segurou-se no ombro do sobrinho e sentiu que não passar do chão talvez não fosse tão simples assim. Teve vontade de gritar, de abrir caminho por entre aquela gente toda e correr até as pernas não quererem mais. Constatou que tinha alergia também às pessoas feias/ às barulhentas/ às cafonas/ às agitadas/ às oportunistas/ às lascivas/ às mórbidas/ às estranhas e às óbvias. Sabe, àquelas que respiram... Quis se livrar de todas elas de uma vez. Fechou os olhos, encheu a mão com meia dúzia de seres imprescindíveis e reconheceu ali sua porção de humanidade. Vestiu sua carapuça de vidro e preparou-se para sair à rua; não teve mais medo ou pena de ninguém.

DIY

A chuva insiste em cair, e eu, embebida em puro ócio, não paro de pensar no quanto as pessoas me fazem mal. Poderia escrever uma mini história sobre uma menina fraca, sempre doente, cansada e triste. Cada vez mais fraca, abatida e preocupada com a opinião de seus superiores, ela consultou vários especialistas do campo prático ao espiritual - tomou muitos remédios, fez passes e simpatias,  participou de rituais, ouviu conselhos, mas nada a curou. Um belo dia a pessoa mais improvável descobriu que quem a enfraquecia eram as pessoas. Os outros para ela eram como um balde de criptonita - quanto mais gente, menos energia. Ela então decidiu afastar-se das pessoas. Fez um protesto sobre o uso do telefone, distribuiu meias respostas e não se deu ao trabalho de fazer qualquer pergunta. Ainda assim, não melhorava. Ficou em dúvida com relação à natureza dessas pessoas, e quis saber se somente os otários, falsos, enxeridos e desocupados tinham um efeito ruim sobre ela. Para tirar a dúvida, foi a um evento na Praça da Liberdade num domingo quente, próximo ao Natal. Um formigueiro; um pesadelo; um show de horror. Segurou-se no ombro do sobrinho e sentiu que não passar do chão talvez não fosse tão simples assim. Teve vontade de gritar, de abrir caminho por entre aquela gente toda e correr até as pernas não quererem mais. Constatou que tinha alergia também às pessoas feias/ às barulhentas/ às cafonas/ às agitadas/ às oportunistas/ às lascivas/ às mórbidas/ às estranhas e às óbvias. Sabe, àquelas que respiram... Quis se livrar de todas elas de uma vez. Fechou os olhos, encheu a mão com meia dúzia de seres imprescindíveis e reconheceu ali sua porção de humanidade. Vestiu sua carapuça de vidro e preparou-se para sair à rua; não teve mais medo ou pena de ninguém.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

A outra

Ela segurava seu rosto e sentia a barba macia. As mãos estavam trêmulas - como era belo! Olhava com dificuldade dentro daqueles olhos escuros e pequenos; tudo girava ao seu redor. Com o coração apertado, comunicou sua vontade. Ele concordou - pensava exatamente da mesma forma. O jovem casal de amantes chorou lágrimas de verdade.

Havia escolhido casar-se com o amigo da escola. O melhor amigo, aquele que sabia de tudo. Conhecidos desde sempre, partilharam o primeiro, o segundo e todos os beijos, dividiram os detalhes sórdidos de cada transa. Um dia surgiu o desejo mútuo de participar da mesma cena, unir as forças malucas perdidas com um monte de pessoas erradas. Um dia se olharam e acharam que aquela era uma combinação interessante. Foi encantador; familiar; confortável; seguro; completo; onipresente. No outro dia também. No mês seguinte, a simbiose era evidente. Discutiam casamento e filhos deitados na grama, cobertos de nuvens. Sem demora o casamento aconteceu. Ele casou-se com outra. Anna nasceu logo depois, e enquanto ela mamava no peito  a esposa decidiu que estava na hora de encomendar Davi. 

É amor isso que está acontecendo conosco? Um dia se olharam e acharam que não havia mais  saída. Num ímpeto o pensamento alcançou outras pessoas - era hora de olharem em volta. Eu... Eu sei, eu também. Você... Não sei. Você? Sei lá. Fica mais um pouco? Até quando? Primeiro até amanhã. Depois a gente vê... Pipoca? Sorvete. Você... Amo, amo sim. Você... é, te amo também. Então por quê? Por um tanto de motivos, por nenhum - afinal quem precisa de um motivo nos dias de hoje? Será que amanhã isso vai passar? Talvez, pode ser. Me abraça bem forte, e aí pode ser que a gente não sinta mais tanto medo. Até amanhã? É, até amanhã. Depois a gente vê...

A outra

Ela segurava seu rosto e sentia a barba macia. As mãos estavam trêmulas - como era belo! Olhava com dificuldade dentro daqueles olhos escuros e pequenos; tudo girava ao seu redor. Com o coração apertado, comunicou sua vontade. Ele concordou - pensava exatamente da mesma forma. O jovem casal de amantes chorou lágrimas de verdade.

Havia escolhido casar-se com o amigo da escola. O melhor amigo, aquele que sabia de tudo. Conhecidos desde sempre, partilharam o primeiro, o segundo e todos os beijos, dividiram os detalhes sórdidos de cada transa. Um dia surgiu o desejo mútuo de participar da mesma cena, unir as forças malucas perdidas com um monte de pessoas erradas. Um dia se olharam e acharam que aquela era uma combinação interessante. Foi encantador; familiar; confortável; seguro; completo; onipresente. No outro dia também. No mês seguinte, a simbiose era evidente. Discutiam casamento e filhos deitados na grama, cobertos de nuvens. Sem demora o casamento aconteceu. Ele casou-se com outra. Anna nasceu logo depois, e enquanto ela mamava no peito  a esposa decidiu que estava na hora de encomendar Davi. 

É amor isso que está acontecendo conosco? Um dia se olharam e acharam que não havia mais  saída. Num ímpeto o pensamento alcançou outras pessoas - era hora de olharem em volta. Eu... Eu sei, eu também. Você... Não sei. Você? Sei lá. Fica mais um pouco? Até quando? Primeiro até amanhã. Depois a gente vê... Pipoca? Sorvete. Você... Amo, amo sim. Você... é, te amo também. Então por quê? Por um tanto de motivos, por nenhum - afinal quem precisa de um motivo nos dias de hoje? Será que amanhã isso vai passar? Talvez, pode ser. Me abraça bem forte, e aí pode ser que a gente não sinta mais tanto medo. Até amanhã? É, até amanhã. Depois a gente vê...

Punk

"Too smart for school, too stupid for work" - I just don't know where the fuck this will take me...

Punk

"Too smart for school, too stupid for work" - I just don't know where the fuck this will take me...

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

A casa das sete mulheres

Sem sombra de dúvida há dúvida em tudo que a gente faz. Depois de Matrix e do show de Truman, nem a certeza de viver do jeito que a gente acha que vive faz mais tanto sentido. Às vezes entro nuns transes tão intensos que fico pensando se sou uma ou duas ou várias pessoas se revezando pra banda tocar direito. Quando choro entendo que uma delas  faltou ao trabalho e sobrecarregou as demais. Até que ser várias é uma boa desculpa para meu fracasso sempre que tento construir alguma coisa.

A casa das sete mulheres

Sem sombra de dúvida há dúvida em tudo que a gente faz. Depois de Matrix e do show de Truman, nem a certeza de viver do jeito que a gente acha que vive faz mais tanto sentido. Às vezes entro nuns transes tão intensos que fico pensando se sou uma ou duas ou várias pessoas se revezando pra banda tocar direito. Quando choro entendo que uma delas  faltou ao trabalho e sobrecarregou as demais. Até que ser várias é uma boa desculpa para meu fracasso sempre que tento construir alguma coisa.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Encontro marcado

E aí,
tem um
cigarro?
Não,
mas
poderia
ter.
Poderia
fazer
você
fumar
outra
vez.
Posso
ser
o que
você
quiser,
dama
da
sociedade
ou
gata
de rua
é só
dizer.
Em
troca
você
me dá
o prazer
de
devolver-
te
o vício
e aí
só aí
você vai
poder
se entregar
ao querer
e viver
toda
uma vida
acreditando
que
a culpa
nunca
foi
sua.

Encontro marcado

E aí,
tem um
cigarro?
Não,
mas
poderia
ter.
Poderia
fazer
você
fumar
outra
vez.
Posso
ser
o que
você
quiser,
dama
da
sociedade
ou
gata
de rua
é só
dizer.
Em
troca
você
me dá
o prazer
de
devolver-
te
o vício
e aí
só aí
você vai
poder
se entregar
ao querer
e viver
toda
uma vida
acreditando
que
a culpa
nunca
foi
sua.

Light my fire

No dia em que eu disser foda-se, diga putaquipariu - só assim eu vou saber se achei o que estava procurando... Grite, xingue como nunca xingou antes, mas faça-o de forma geniosa, para que eu me cubra de deleite com a magia do seu emputecimento - deixe essas palavras todas fluírem em mim! Reclame que as coisas não são assim e serei sua for life, e nadarei de braços abertos pela sua masculinidade, e afagarei seus cabelos com calculada indiferença, até você me olhar com inocência e pedir mais. Diga merda, merda, fique indignado! Enquanto isso vou assistir a tudo com um sorriso ambíguo no rosto e um balde de pipoca do lado, pronta para o que vem depois.

Light my fire

No dia em que eu disser foda-se, diga putaquipariu - só assim eu vou saber se achei o que estava procurando... Grite, xingue como nunca xingou antes, mas faça-o de forma geniosa, para que eu me cubra de deleite com a magia do seu emputecimento - deixe essas palavras todas fluírem em mim! Reclame que as coisas não são assim e serei sua for life, e nadarei de braços abertos pela sua masculinidade, e afagarei seus cabelos com calculada indiferença, até você me olhar com inocência e pedir mais. Diga merda, merda, fique indignado! Enquanto isso vou assistir a tudo com um sorriso ambíguo no rosto e um balde de pipoca do lado, pronta para o que vem depois.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Antes da chuva

Ballet. Aulas de inglês. Rock'n'roll. Devaneios atemporais. Livros, livros, livros... Afinal, será que é assim que uma pessoa consegue ser plena? Perdendo-se alucinadamente em cada lojinha de doces? Abrindo a porta da sua cabeça e deixando todo mundo entrar? Que tal oferecer um pedaço seu na barganha? Você deixa a pessoa entrar e ainda dá uma surpresinha pra mantê-la ao menos... domesticada. Por que será que dói quando alguém cuja existência ainda não foi descoberta curte a sua festinha, leva a surpresa pra enfeitar a sala de estar e ainda fala mal do bolo e da decoração? Por que acreditar que o que não mata nos fortalece? Medo de ser fraco... de estar perdido e acabar no lugar errado. Já li receitas prontas, já conheci profissionais de sucesso, pessoas que se orgulham do que fazem e contam as calorias para alcançarem uma vida plena freneticamente. Pessoas que anotam cada centavo que sai da carteira compulsivamente, e assim equilibram suas contas. Pessoas que se acostumaram a sorrir e a comer comida fria porque é o que dá pra fazer. Pessoas que resolvem jogar tudo pra cima e começam de novo, e após o primeiro tropeço são tomadas pelo pavor e sonham com todas aquelas caras diárias sussurrando "eu avisei". Pessoas que nasceram sabendo o que queriam ser e tiveram sorte; pessoas que nasceram sabendo o que queriam ser e passaram a vida correndo na direção oposta por achar que não seria digno. O mundo está cheio de pessoas buscando coisas, sentimentos, outras pessoas. E cá entre nós, será que a cabeça aguenta se você parar? Era uma vez um enviado do Messias que durante anos preservou sua existência rogando pragas homéricas a quem quer que o ousasse tocar. Ele foi mantido preso em segredo e era temido por todos que o sabiam. Durante uma celebração no castelo, uma bela mulher enfeitiçou o rei com  sua dança e se ofereceu em troca da cabeça do traidor. O rei não pensou duas vezes e pediu ao carrasco para executá-lo. Em poucos minutos a cabeça circulava em uma bandeja, para delírio dos convidados. No dia seguinte, três discípulos chegaram ao castelo para buscá-la. Aceitaram resignados sua tarefa, e o conto termina dizendo que como o sol era quente e a cabeça era muito pesada, tiveram que se revezar várias vezes pelo caminho. Espera pela recompensa ou medo do castigo, o que diabos nos move? Esperei o semestre todo para poder andar de patins pela Praça do Papa, com medo de me machucar e não poder participar do festival de ballet. Já passou o festival e os patins continuam no armário. Ensaiei o semestre todo para poder tocar no final do ano. Faço o que tenho que fazer, mas ainda assim sempre conto com um milagre - não confio na capacidade trivial do ser humano. Sabe aquele tempo meu e seu, aquele tempo em que nós dois éramos células pulsantes em um organismo tão peculiar? Na verdade ele nunca existiu. Eu existo aqui e você existe lá. Jamais conseguiremos nos ajudar a escolher a estrada porque somos diferentes. Olho pra mim aqui, feita de tanta coisa, e te desejo boa sorte sem sequer saber quem de nós vai precisar mais. Da janela o céu tenta me dizer que deve ser isso mesmo, e me sorri sem censura antes da chuva cair.

Antes da chuva

Ballet. Aulas de inglês. Rock'n'roll. Devaneios atemporais. Livros, livros, livros... Afinal, será que é assim que uma pessoa consegue ser plena? Perdendo-se alucinadamente em cada lojinha de doces? Abrindo a porta da sua cabeça e deixando todo mundo entrar? Que tal oferecer um pedaço seu na barganha? Você deixa a pessoa entrar e ainda dá uma surpresinha pra mantê-la ao menos... domesticada. Por que será que dói quando alguém cuja existência ainda não foi descoberta curte a sua festinha, leva a surpresa pra enfeitar a sala de estar e ainda fala mal do bolo e da decoração? Por que acreditar que o que não mata nos fortalece? Medo de ser fraco... de estar perdido e acabar no lugar errado. Já li receitas prontas, já conheci profissionais de sucesso, pessoas que se orgulham do que fazem e contam as calorias para alcançarem uma vida plena freneticamente. Pessoas que anotam cada centavo que sai da carteira compulsivamente, e assim equilibram suas contas. Pessoas que se acostumaram a sorrir e a comer comida fria porque é o que dá pra fazer. Pessoas que resolvem jogar tudo pra cima e começam de novo, e após o primeiro tropeço são tomadas pelo pavor e sonham com todas aquelas caras diárias sussurrando "eu avisei". Pessoas que nasceram sabendo o que queriam ser e tiveram sorte; pessoas que nasceram sabendo o que queriam ser e passaram a vida correndo na direção oposta por achar que não seria digno. O mundo está cheio de pessoas buscando coisas, sentimentos, outras pessoas. E cá entre nós, será que a cabeça aguenta se você parar? Era uma vez um enviado do Messias que durante anos preservou sua existência rogando pragas homéricas a quem quer que o ousasse tocar. Ele foi mantido preso em segredo e era temido por todos que o sabiam. Durante uma celebração no castelo, uma bela mulher enfeitiçou o rei com  sua dança e se ofereceu em troca da cabeça do traidor. O rei não pensou duas vezes e pediu ao carrasco para executá-lo. Em poucos minutos a cabeça circulava em uma bandeja, para delírio dos convidados. No dia seguinte, três discípulos chegaram ao castelo para buscá-la. Aceitaram resignados sua tarefa, e o conto termina dizendo que como o sol era quente e a cabeça era muito pesada, tiveram que se revezar várias vezes pelo caminho. Espera pela recompensa ou medo do castigo, o que diabos nos move? Esperei o semestre todo para poder andar de patins pela Praça do Papa, com medo de me machucar e não poder participar do festival de ballet. Já passou o festival e os patins continuam no armário. Ensaiei o semestre todo para poder tocar no final do ano. Faço o que tenho que fazer, mas ainda assim sempre conto com um milagre - não confio na capacidade trivial do ser humano. Sabe aquele tempo meu e seu, aquele tempo em que nós dois éramos células pulsantes em um organismo tão peculiar? Na verdade ele nunca existiu. Eu existo aqui e você existe lá. Jamais conseguiremos nos ajudar a escolher a estrada porque somos diferentes. Olho pra mim aqui, feita de tanta coisa, e te desejo boa sorte sem sequer saber quem de nós vai precisar mais. Da janela o céu tenta me dizer que deve ser isso mesmo, e me sorri sem censura antes da chuva cair.