sexta-feira, 2 de outubro de 2015

Playmate

São 21.20 de um dia comum e eu estou aqui a falar de mim comigo mesma, dentro de uma sala de aula que coabita a minha existência, prisão de mentira. Liguei uma música clássica durante a prova e os alunos me olharam sem entenderem se era inspiração, tédio ou agonia. Decepção, reflexão de praxe talvez, sensação de que aquele sapato não me serve mais. Cheguei a um ponto da vida em que apresentar um seminário na disciplina do doutorado com calafrios de febre deixou de ser um drama pessoal pra virar evento corriqueiro. Afinal das contas que acerto com meus lençóis de algodão - e sem essa de dia sim dia não! - eu passo a vida correndo e pensando em nós, correndo e pensando em vocês, correndo de carro ou a pé, sempre querendo chegar... sempre... De sala em sala, uma breve passada em casa, um beijo na mãe, um oi pro sobrinho que cresceu e agora acha que beijar a tia é careta pra caralho, um oi pras irmãs via SMS, um beijo no pai que mora perto-longe via email, uma superhipermega otimização do meu tempo "livre" pra pedir colo. Esses momentos de prova, em que espero até o último aluno sair da sala, são uma prova também pra mim, que a minha cabeça pensa sem parar, que entender o outro não é brincadeira, que colocar uma cerca ao redor da casa pode ser uma tarefa complicada se o dono dela não gostar da cor. Fico tentando entender se quando acabar o maluco sou eu, mas tem tanta coisa além da minha compreensão hoje em dia que às vezes eu nem consigo chorar, nem gritar bem alto pra neguinho entender que eu não nasci pra brincar de casinha e contar pra minha mãe que um menino bobo e feio puxou o meu cabelo só porque eu pedi a ele que me ajudasse a arrumar a bagunça depois da festa. Onde está o cuidado que mora nos sonhos de toda mulher? Muitas mulheres abriram mão de recebê-lo pelo status da companhia. Acho tão bonita a palavra ALTERIDADE, que aprendi ao estudar sobre a relação professor-aluno... muito bonita e pouco conhecida - e ainda que estivesse na ponta da língua de quem quer que fale nosso bom português, palavra não é ato, não é fato e não enche barriga de quem tem fome do fazer, saudade do acontecer e pressa pra realizar. Construir mete medo; caminhar gera dúvida; ceder, admitir e evoluir passam longe do dicionário usado pelo autossuficiente, autoindulgente que não erra jamais. Sensação de que aquele sapato não me serve mais, que talvez nunca serviu, que eu só pus no pé pra ser princesa... sem cavalo, sem vestido, sem príncipe ou castelo.

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