segunda-feira, 16 de março de 2020

Quarentena

De dentro da minha casa acompanho o girar do mundo mesmo sem querer. Abro meu pequeno laptop e as palavras e os vídeos, os fatos e as fotos vêm me atravessando sem eu pedir. Olho meu whatzapp e minha mãe me pede pra não ir à casa dela, que ela tem 67 e não pode nem sair na rua, e minhas amigas não virão me ver porque eu posso estar infectada, mesmo sem casos confirmados, mesmo ter ido ao shopping Oi esse ano, mesmo sem sintomas. No meu trabalho já me proibiram de aparecer, e na academia me olharam com terror quando, com muita educação, espirrei no meu braço. Hoje fui ao médico - a única pessoa que me tratou como um ser humano normal nesses últimos dias. De lá fui almoçar em um pequeno restaurante e me acomodei com facilidade. Entrei muda e saí calada pra ninguém perceber meu nariz entupido. Trabalhei o dia todo pelo computador até os dedos doerem de lástima e a cabeça latejar de pura preguiça. Passei o dia recebendo notícias sobre prevenção, contaminação, sugestão, falta de comida, medo pela vida de quem pode de fato morrer. Mas não é essa nossa única certeza? Meu pai disse hoje que pode estar infectado - ele tem 71 e tá longe de ser dos mais saudáveis. Putz, aí não... Sem frieza ou egoísmo, informo que tudo bem - diga ao povo que fico aqui bem quieta, trabalhando do meu quarto. Dia 18 entraremos oficialmente em quarentena, e a quarentona que se vire pra ficar boa sem remédio, sem colo de mãe e sem abraço de mais ninguém.

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