segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Dear Prudence

Prudêncio era um sujeito taciturno que não acreditava nas vantagens de um bom café da manhã. Tomava leite porque o leite vem da vaca e a vaca vem de Deus, mas não tinha uma posição definida acerca de sua comercialização. Teve uma namorada na infância, Maria Laura, mas durante sua adolescência achou que o melhor mesmo era deixá-la sozinha - tinha muita coisa pra ela descobrir na vida, e a simples possibilidade de ter que ensiná-la enchia-o de calafrios. Sentia preguiça. Passou alguns anos de sua vida com preguiça de todos - dos professores, que sabiam tão pouco; dos alunos, que nada diziam; dos colegas com seus papos enfadonhos; das meninas com seu comportamento calculadamente bestial. Não falava com os pais, mas lia bastante. Maria Laura reapareceu numa tarde de julho e ele achou que seria uma boa idéia falar com ela. Falaram-se, encontraram-se depois e depois, aproximaram-se. Ela não era como as outras, ele pensava; era suave e gostava de dar voltas de bicicleta na Praça do Papa - vinte e duas voltas, e então ia para casa. Maria Laura falava baixo e tinha as bochechas rosadas e mãos rechonchudas. Lia muito, como ele, e as conversas se estendiam pela noite como um forro de luz. Conversavam sobre gregos e troianos, e ele ficava intrigado quando sentia uma espécie de vertigem ao vê-la esconder as mãos juntas debaixo das pernas e sorrir devagar. Não sabia o que poderia ser aquilo, e começou a achar que essa situação não lhe convinha. Aos poucos foi se afastando de Maria Laura, não podia mais acontecer. Ela uma noite abriu a porta, subiu as escadas e disse Te amo, Prudêncio. Você aceita se casar comigo?

Prudêncio ficou mudo. Não conseguia achar coisa alguma. Pra onde tinha ido toda aquela sabedoria inventada? Pediu um tempo para pensar e deveras pensou em tudo. Tardes e noites se passaram enquanto ele calculava prós e contras maquinalmente, sem parar para descansar. Um dia ele parou de pensar e achou que casar não valeria a pena. Procurou Maria Laura e disse com muita naturalidade que nada compensaria a companhia de alguém que vai acabar tomando cerveja e falando mais alto que você. Comprou um cachorro e resolveu para os próximos 15 anos o problema de uma possível solidão. 

O tempo passou, muita coisa mudou e Maria Laura ainda espera que ele abra de repente a porta e diga Desculpe, mesmo sabendo que não há o que esperar.

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