Eu poderia começar essa história dizendo que era uma vez, em um reino muito, muito distante, uma bela princesa, que um dia teve a urgência de saber sobre seu futuro. Erros eram uma constante para ela, mas nada poderia sair errado dessa vez: a princesa estava prestes a se casar. Sua vida sempre fora recheada de perigos e todo o tipo de surpresas - por esse motivo, nossa princesa havia decidido que nunca a enfrentaria só. Ela chorou, rezou e esperou, até que um dia concluiu o óbvio: precisava descobrir o que aconteceria depois.
Poderia continuar dizendo que o motivo de tal aflição era a quantidade de pretendentes. Havia o amante latino, o namorado antigo e o príncipe encantado - e era sabido que o curso natural das coisas é geralmente ficar com o certo e sonhar esporadicamente com o duvidoso. Isso certamente poderia ter acontecido sem prejuízo a parte alguma, mas a princesa não se conformava com esse final nada apropriado para um conto de fadas que se preze. Atendendo às recomendações de uma amiga experiente em questões que não se explicam - e sentindo-se pateticamente ludibriada de antemão - ela saiu de casa pela segunda-feira afora e só parou de caminhar quando viu à sua frente uma porta amarela. A campainha soou, uma voz ecoou - a porta se abriu e a princesa sem demora entrou.
Poderia dizer a vocês que em poucos minutos a princesa se encontrava com Madame Fortunata, que com avidez gatuna e coloridos balangandãs a encantava. A névoa, os aromas, os quadros, as cartas, tudo parecia um sonho próximo, onde não se faz muita coisa, só se escuta.
"São três", disse a velha, que de bonito só tinha o ouro dos dentes. "Um vai tão rápido quanto chegou - pedaço de carne, coração de vidro. Pena - bonito que só ele".
Fortunata deu uma baforada no charuto, colocou mais uma carta na mesa e prosseguiu:
"Esse é o de sempre, de todo dia. Fraco - um inútil, coitado. Precisa de rédea, de direção, força pra pôr esse sujeito pra caminhar. Trabalhar por dois."
A carta seguinte causou na cigana reação estranha. Ela pigarreou, colocou e tirou os óculos cobertos de gordura. Levantou-se. "Vou pegar um copo d'água", disse cambaleando pelo cômodo.
Ao retornar, ainda com as mãos trêmulas e a feição abatida, ela deu um longo suspiro antes de proferir o veredito.
"Está claro que o melhor a fazer é casar com seu Romeu, o prometido a você pela Lua e pelas estrelas. Seja forte e tenha paciência, que Nosso Senhor há de cuidar do resto."
A princesa esboçou um gesto, mas foi bruscamente interrompida:
"Sem mais, minha filha. O terceiro cavalheiro nutre por sua pessoa sincero respeito, nada mais. Trate de esquecê-lo, porque em breve ele não se lembrará: pensar nele só vai lhe fazer sofrer. Ame e respeite seu marido até que ele se vá, e então prepare-se para unir-se a ele na eternidade."
A princesa não disse nada; não retrucou; não chorou; não discordou. Casou-se com seu Romeu e passou o resto de sua longa vida ao lado dele. Foi uma vida tranquila e sem emoções, como manda quem pode e obedece quem tem juízo. O marido se foi e com o tempo a princesa voltou a sonhar com o terceiro cavalheiro. Por onde andaria? Será que se lembrava dela? Subitamente se recordou das palavras de Madame Fortunata e tratou de calar todo e qualquer pensamento. Devotou-se à caridade e esperou pelo marido até que ele a chamasse.
É claro que Madame Fortunata viu algo naquela segunda-feira branca como a noite, você deve estar pensando. O terceiro cavalheiro!, você se lembra. Ele deveria ter sido o escolhido, você conclui. Eu poderia concordar, e acrescentar que ele abriria a porta da novidade e a cruzaria com a princesa em seus braços, olhos negros radiantes de contentamento. Mas por que ela teria ocultado a verdade? Talvez por que o amor impossível é o único verdadeiramente romântico, ou porque o amor precisa ser consumido com moderação para que seja eterno enquanto dure. Como é que vamos saber?
Sabendo, ora! O fato é que nossa cartomante foi vítima de um mal estar corriqueiro e por isso precisou se ausentar por alguns minutos. Ela não viu nada demais porque não viu nada - não se prevê o futuro, não se evita o infortúnio com búzios supersônicos. Ela sabia... e a princesa também. O que ela leu é o que entendemos por bom senso, é o que leva pessoas como eu e você a terem uma casa, um carro, um emprego, amigos, uma bela família e sopa morna no prato todos os dias às sete e trinta e cinco.
Eu poderia continuar estendendo minhas entrelinhas de indignação lacônica, mas prefiro contar o final da história: o primeiro camarada é um figurante, o segundo toma sopa morna e o terceiro cavalheiro usa drogas e não tem onde cair morto. Madame Fortunata é, obviamente, a mãe da princesa ;)
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