segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Segredo

Eu não sou triste
Nem sou poeta:
A hora existe
Mas não é certa
O pisca-alerta
Já está ligado
A porta, aberta,
O carro, usado
Ficar calado
É o que te importa.
Não abra a porta;
Ainda é cedo.
Só sinto medo
Do que há de ser.

Sair da toca
Fechar a boca
Piscar de longe
Bancar a louca...
Não feche a porta;
Tenho um segredo.
Ao som do vento
Do arvoredo
Serei sorriso
Por um momento
Se o samba enredo
Daquele dia
Não se perder...

Abra essa a porta
Pr’eu tomar tento -
Que ela se feche
Com sentimento
Pra que no embalo
Dessa batida
Eu possa esquecer...

Segredo

Eu não sou triste
Nem sou poeta:
A hora existe
Mas não é certa
O pisca-alerta
Já está ligado
A porta, aberta,
O carro, usado
Ficar calado
É o que te importa.
Não abra a porta;
Ainda é cedo.
Só sinto medo
Do que há de ser.

Sair da toca
Fechar a boca
Piscar de longe
Bancar a louca...
Não feche a porta;
Tenho um segredo.
Ao som do vento
Do arvoredo
Serei sorriso
Por um momento
Se o samba enredo
Daquele dia
Não se perder...

Abra essa a porta
Pr’eu tomar tento -
Que ela se feche
Com sentimento
Pra que no embalo
Dessa batida
Eu possa esquecer...

sábado, 24 de janeiro de 2009

Capítulo 5 - Ô cidadezinha, sô!

Fala, gente,

Bem, essa semana já estou bem mais "ambientada" por aqui e estou começando a me sentir meio londrina - ou seja, paranóica e frenética. Sim, porque na semana que vem acaba meu martírio em casa de Madame Satã (my lovely host), mas como vocês ja sabem que rapadura é doce mas não é mole, não, tenho que estar com um novo lar totalmente acertado ate lá. Isso significa que essa semana só bati perna até o fim da vida, fui quase enganada, quase atropelada, fiquei no metrô mais do que no meu quarto (será que isso é bom ou ruim?) e meus dedinhos estão em frangalhos de tanto entrar em sites. Então, uma sugestão: já comecem a olhar no http://www.gumtree.com alguma moradia, algum trampo do Brasil, não esperem chegar aqui. E por falar nisso, outra coisa interessante aqui é o tal do emprego. Emprego aqui é facil demais de arrumar, em toda esquina tem um papelzinho "staff required". Sensacional, né? NADA DISSO!!! Tem mil empregos, mas mil e uma restrições, desde a sua roupa a seu cabelo, passando de leve pelo seu currículo. Ou você aceita lavar pratos de meia-noite às oito da manhã de segunda a sábado pra ganhar menos que o salário mínimo por hora e começa ontem, ou você relaxa e sorri bastante, e manda bastante currículo pra todo o continente, e vai lá de novo e respira fundo quando o cara diz que gostaria muito que vc limpasse o cocô do cachorro dele três vezes por dia - e olha que máximo: esse tem acomodação!!! Deve ser junto com os cachorros, né? Achei engraçado esse lance de procurar emprego de garçonete. Eles querem alguém com experiência, gente, olha que interessante... Como se todo mundo antes de vir pra cá tivesse a obrigação de ter feito um curso preparatório para garçonetes em seu país de origem - sim, porque aqui se tiver custa mais que o seu salarinho suado! Também tem umas agências, que te mandam umas mensagens ou te ligam às 5 da manhã dizendo que tem um trabalho às 7 pra você entregar panfleto. Ou seja, se você tem uma outra ocupação que não seja ser ilegal no país, é muito difícil conseguir um emprego relativamente fixo. E os "por favor, mantenha seu telefone ligado e próximo de você, que ligarei amanhã impreterivelmente"? Nem precisa dizer o que acontece, né? Resumindo, enquanto isso eu vou bebendo… Se nada der certo, tomo uma pinga e vou lavar prato ouvindo Strokes, Cake, Buena Vista, Velvet, White Stripes e tantas outras musiquinhas do meu agrado. Como diz minha inigualável amiga Mandjuras, vai ser só o tempo de uns dois cds dos Strokes, umas 15 músicas do Velvet, um Greatest Hits do Bob Dylan e tudo flui, e tudo passa. E depois e só curtir, porque o tanto de lugares bonitos aqui não tá no gibi! Gente, só mais uma coisa que senti que deveria contar pra vcs: aqui eles comem feijão doce! Juro, feijão normal com aquele molho agridoce que a gente usa no rolinho primavera do chinês! E o mais interessante é que minha roommate da Rep. Tcheca disse que em toda a Europa eles NÃO SABEM, REPITO, NÃO SABEM O QUE É FEIJÃO SALGADO!!!!! Vamos ter que ensinar muita coisa pra esse povo! Ih, já fui ao cinema assistir a uma preestréia de um documentário sobre acid house FANTÁRDIGO!, já fui a uma baladinha de inglês de 00.00 as 8.00 com pulseirinha vip - e gente, por favor não pensem que house é isso que a gente escuta aí, é algo muito melhor!!! - e já passei mal com uma comida vietnamita de dar água na boca (quem vê cara não vê coração!).

Bem, desejem-me sorte, rezem para a santa desatadora dos nós que se Deus quiser - ah, e ele quer, viu? - semana que vem vou ter notícias de arrasar Paris em chamas pra vcs! Bjo enorme!!!

Capítulo 5 - Ô cidadezinha, sô!

Fala, gente,

Bem, essa semana já estou bem mais "ambientada" por aqui e estou começando a me sentir meio londrina - ou seja, paranóica e frenética. Sim, porque na semana que vem acaba meu martírio em casa de Madame Satã (my lovely host), mas como vocês ja sabem que rapadura é doce mas não é mole, não, tenho que estar com um novo lar totalmente acertado ate lá. Isso significa que essa semana só bati perna até o fim da vida, fui quase enganada, quase atropelada, fiquei no metrô mais do que no meu quarto (será que isso é bom ou ruim?) e meus dedinhos estão em frangalhos de tanto entrar em sites. Então, uma sugestão: já comecem a olhar no http://www.gumtree.com alguma moradia, algum trampo do Brasil, não esperem chegar aqui. E por falar nisso, outra coisa interessante aqui é o tal do emprego. Emprego aqui é facil demais de arrumar, em toda esquina tem um papelzinho "staff required". Sensacional, né? NADA DISSO!!! Tem mil empregos, mas mil e uma restrições, desde a sua roupa a seu cabelo, passando de leve pelo seu currículo. Ou você aceita lavar pratos de meia-noite às oito da manhã de segunda a sábado pra ganhar menos que o salário mínimo por hora e começa ontem, ou você relaxa e sorri bastante, e manda bastante currículo pra todo o continente, e vai lá de novo e respira fundo quando o cara diz que gostaria muito que vc limpasse o cocô do cachorro dele três vezes por dia - e olha que máximo: esse tem acomodação!!! Deve ser junto com os cachorros, né? Achei engraçado esse lance de procurar emprego de garçonete. Eles querem alguém com experiência, gente, olha que interessante... Como se todo mundo antes de vir pra cá tivesse a obrigação de ter feito um curso preparatório para garçonetes em seu país de origem - sim, porque aqui se tiver custa mais que o seu salarinho suado! Também tem umas agências, que te mandam umas mensagens ou te ligam às 5 da manhã dizendo que tem um trabalho às 7 pra você entregar panfleto. Ou seja, se você tem uma outra ocupação que não seja ser ilegal no país, é muito difícil conseguir um emprego relativamente fixo. E os "por favor, mantenha seu telefone ligado e próximo de você, que ligarei amanhã impreterivelmente"? Nem precisa dizer o que acontece, né? Resumindo, enquanto isso eu vou bebendo… Se nada der certo, tomo uma pinga e vou lavar prato ouvindo Strokes, Cake, Buena Vista, Velvet, White Stripes e tantas outras musiquinhas do meu agrado. Como diz minha inigualável amiga Mandjuras, vai ser só o tempo de uns dois cds dos Strokes, umas 15 músicas do Velvet, um Greatest Hits do Bob Dylan e tudo flui, e tudo passa. E depois e só curtir, porque o tanto de lugares bonitos aqui não tá no gibi! Gente, só mais uma coisa que senti que deveria contar pra vcs: aqui eles comem feijão doce! Juro, feijão normal com aquele molho agridoce que a gente usa no rolinho primavera do chinês! E o mais interessante é que minha roommate da Rep. Tcheca disse que em toda a Europa eles NÃO SABEM, REPITO, NÃO SABEM O QUE É FEIJÃO SALGADO!!!!! Vamos ter que ensinar muita coisa pra esse povo! Ih, já fui ao cinema assistir a uma preestréia de um documentário sobre acid house FANTÁRDIGO!, já fui a uma baladinha de inglês de 00.00 as 8.00 com pulseirinha vip - e gente, por favor não pensem que house é isso que a gente escuta aí, é algo muito melhor!!! - e já passei mal com uma comida vietnamita de dar água na boca (quem vê cara não vê coração!).

Bem, desejem-me sorte, rezem para a santa desatadora dos nós que se Deus quiser - ah, e ele quer, viu? - semana que vem vou ter notícias de arrasar Paris em chamas pra vcs! Bjo enorme!!!

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Praia minha

Eu vi você.
Eu tive um sonho e quis muito que você fosse real.
Eu realizei o meu sonho de estar com você
No meu sonho
E achei que isso me fosse bastante.
O vento parou de soprar
A brisa entrou no lugar e eu,
Eu não sei,
Acho que só esperei
que só continuei
vivendo
respirando
sentindo que a vida é uma coisa de louco
e em meio a devaneios
com a cabeça doendo de erros e acertos
eu vi você
e o mundo parou
e o som ficou macio
e o barulho ficou lento
e a pele ficou confusa
o calor se multiplicou e eu não pude parar.
Cheguei perto
tirei o coração da boca
e pus na bolsa
vesti uma carapuça de vidro
e mergulhei no desconhecido
.
.
.
Ainda hoje carrego areia nos cabelos
e conchas que cantam os versos mais lindos por minh'alma afora.

Praia minha

Eu vi você.
Eu tive um sonho e quis muito que você fosse real.
Eu realizei o meu sonho de estar com você
No meu sonho
E achei que isso me fosse bastante.
O vento parou de soprar
A brisa entrou no lugar e eu,
Eu não sei,
Acho que só esperei
que só continuei
vivendo
respirando
sentindo que a vida é uma coisa de louco
e em meio a devaneios
com a cabeça doendo de erros e acertos
eu vi você
e o mundo parou
e o som ficou macio
e o barulho ficou lento
e a pele ficou confusa
o calor se multiplicou e eu não pude parar.
Cheguei perto
tirei o coração da boca
e pus na bolsa
vesti uma carapuça de vidro
e mergulhei no desconhecido
.
.
.
Ainda hoje carrego areia nos cabelos
e conchas que cantam os versos mais lindos por minh'alma afora.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Capítulo 4 - Agooooora siiiiiiiimmm!

Ei, gente!Agora finalmente estou pegando o jeito das coisas! Estou andando de metrô sozinha, e descobri como os ônibus funcionam. Depois que vc entende isso, tudo melhora, impressionante. Os parques aqui são lindos, fica todo mundo sentado na grama lendo, conversando, namorando... Uma novidade boa: se tudo der certo, começo a trabalhar na semana que vem em uma loja. O lugar é bem central e perto do metrô, então fica fácil ir embora depois. Tomara! Gente, tô chocada com os preços das roupas aqui, Deus me ajude! Pra comecar, a Zara aqui não é nem uma C&A, é tipo uma Marisa: roupas de 2,3,4,10 libras por um casaco! Calças de brim por 8 libras, SURREAL!!! Tô me segurando bastante - só quando eu ganhar em libras é que vai começar a cair a ficha, e aí ninguém segura esse bebê, hehehe... Tem umas coisas muito legais aqui, bem diferentes, em se tratando de roupas e acessórios, e é lógico que também tem coisas caríssimas, mas a maioria é de boa qualidade e bons preços (principalmente pra quem mora aqui). Com isso estou com uma pergunta que não quer calar: por que as inglesas são tão bregas? Pode estar o frio que for, que quanto menor e mais apertada for a roupa, melhor é pra elas. E a maquiagem, gente, inacreditável... Os sapatos são meio carinhos, mas cada um!!! Amei a Oxford Street - é uma rua basicamente de roupas, sapatos e acessórios, enorme, que tem desde os mais caros aos mais baratos. Tem que andar bastante aqui pra não dar bobeira. Camden Town, como já tinha me dito meu amigo Leo Veiga, é a minha cara!!!

Agora estou começando a conhecer os pubs de inglês, porque os de turista são ridículos. Um conselho: se vcs vierem aqui, não vão ao Walkabout – só vão se forem tomar uma rápida ou assistir futebol, porque no final da semana fica uma farofa gringa que dá medo... É um bar – uma cadeia de bares, tipo o Amarelinho – de australianos e eles são bem grosseiros. Além disso, o bar nem é legal. Um dos eventos da escola é o karaokê do Walkabout Finchley Road, às quintas. Fui empolgada com minhas roomates – aliás, Katerina ficou pra trás porque tem 17 – achando que ia cantar muito e que ia ser o máximo. Nem precisa dizer que só tinha Britneys e Justins pulando e fazendo coreografias de dar inveja a qualquer macaco com hemorróida. Como se não bastasse, comprei uma pint – gente, quase uma garrafa de cerveja – e dois minutos depois um gorila gigantesco começou a querer me colocar pra fora. Como vocês devem saber, é proibido tomar qualquer bebida alcoólica na rua, e com isso eu disse que se tinham me vendido uma bebida lá dentro há um minuto, eu teria que poder tomá-la até acabar. Que isso, o gorila sem cérebro foi me EMPURRANDO para a porta, dizendo que eles estavam fechando e que ele não estava nem aí se eu estava bebendo ou não. Ou seja: não dêem dinheiro pra macaco, eles não sabem o que fazer com ele – em outras palavras, nunca vão a esse lugar!

Tô me achando aqui, tomando Guinness no boteco da esquina! O curso aos poucos tá ficando melhor, e todo dia tem caminhadas com os professores pra algum parque ou lugar mais tradicional nos arredores. Tem um cartão chamado Oyster que funciona em toda a cidade, e pagando semanalmente ou mensalmente - ou acho que até diariamente - você anda de metrô nas suas zonas de preferência e de ônibus pra todo lado. Essa é uma boa dica pra quem vier pra cá – vá até uma estação de metrô e compre o seu. Outra dica importantíssima: façam amizade com ingleses: além de o inglês deles ser perfeito (por que será?), eles vão te aplicar na boa e velha Londres. Já apareceram três lugares pra eu morar a partir de setembro e tô analisando as opções, principalmente porque a galera conta bastante.

Comecei a descobrir que aqui é um lugar muito legal porque, basicamente, se você fala inglês, você não precisa de ninguém pra te acompanhar a lugar nenhum! Dá uma sensação de independência incrível simplesmente pegar o metrõ, escolher uma estação, descer lá e começar a andar, achar um filme legal no cinema, entrar e assistir, sentar num parque pra ler, pegar um ônibus só pra tirar foto do segundo andar, entrar numa loja e fazer mil perguntas - os ingleses são meio chatos, mas a galera de outras nacionalidades, maioria absoluta aliás, é muito receptiva – principalmente os indianos e paquistaneses. Outra coisa ótima é que, como a cidade é enorme, sempre vai ter um lugar onde vc nunca foi. Caminhar aqui é otimo, porque os lugares são tão bonitos que a gente nem vê que está andando, e para melhorar ainda mais, a cidade é praticamente toda plana. Mas cuidado: andar de bicicleta, só se for mto experiente, não tiver medo de morrer ou no próprio bairro, em parques ou lugares do tipo, porque os ingleses são frenéticos no trãnsito – tipo a gente mesmo – , e o trânsito aqui é muito confuso. Eu que sou uma pessoa super corajosa e exímia ciclista, só de ver aquelas bicicletinhas disputando espaço com um double-decker bus, motos e carros em ruas que são quase tão estreitas quanto às de Ouro Preto, rezo para a padroeira dos bicicleteiros todos os dias.

O pessoal aqui em geral está sempre correndo, engolindo um sanduíche no metrô e correndo, correndo, exatamente como o coelho branco de Alice, olhando os relógios e nunca, jamais, pra outras pessoas. Inclusive, existe uma política aqui de que todo mundo deve ficar do lado direito da escada rolante, porque o lado esquerdo é pra quem quer ir mais rápido. Essa escada aliás é surreal, parece que vc tá entrando num túnel de um filme de ficção científica, umas quatro escadas com a galera correndo no meio, altasso, e sempre rolando um show ao vivo lá em baixo. Tem muita gente que canta no metrô. Sinceramente, se vendessem cerveja e tivesse banheiro, ficaria lá mesmo, porque os shows são geralmente bons.

Rolou festa de encerramento das olimpíadas na Trafalgar Square com fogos, telão, desfile, um show meio esquisito – sempre vão existir os fãs dessas coisas cult de gente seminua dançando de uma forma estranha com uma música tipo Bjork ao fundo -, no mínimo divertido. Ontem teve jogo de futebol aqui e pela primeira vez vi os Hooligans – ou o que restou deles. Eles começam a beber cedo, nem dá pra tentar acompanhar - até porque pensar no preço de uma pint em reais dá dor de cabeça... Como já dizia minha amiga Camilex, “quem converte não diverte!” Vamos ver por quanto tempo vou conseguir me divertir...

Um grande beijo e hasta lo próximo capítulo (portunhol rules!!!)

Errata: A Zara é a Zara mesmo, mas estava em liquidação, e liquidação aqui é de verdade, não como as do Brasil, em que as lojas colocam os preços originais como se estivessem com desconto e aumentam os que seriam os antigos pra gente achar que tem promoção. Ai, Brasil!

Capítulo 4 - Agooooora siiiiiiiimmm!

Ei, gente!Agora finalmente estou pegando o jeito das coisas! Estou andando de metrô sozinha, e descobri como os ônibus funcionam. Depois que vc entende isso, tudo melhora, impressionante. Os parques aqui são lindos, fica todo mundo sentado na grama lendo, conversando, namorando... Uma novidade boa: se tudo der certo, começo a trabalhar na semana que vem em uma loja. O lugar é bem central e perto do metrô, então fica fácil ir embora depois. Tomara! Gente, tô chocada com os preços das roupas aqui, Deus me ajude! Pra comecar, a Zara aqui não é nem uma C&A, é tipo uma Marisa: roupas de 2,3,4,10 libras por um casaco! Calças de brim por 8 libras, SURREAL!!! Tô me segurando bastante - só quando eu ganhar em libras é que vai começar a cair a ficha, e aí ninguém segura esse bebê, hehehe... Tem umas coisas muito legais aqui, bem diferentes, em se tratando de roupas e acessórios, e é lógico que também tem coisas caríssimas, mas a maioria é de boa qualidade e bons preços (principalmente pra quem mora aqui). Com isso estou com uma pergunta que não quer calar: por que as inglesas são tão bregas? Pode estar o frio que for, que quanto menor e mais apertada for a roupa, melhor é pra elas. E a maquiagem, gente, inacreditável... Os sapatos são meio carinhos, mas cada um!!! Amei a Oxford Street - é uma rua basicamente de roupas, sapatos e acessórios, enorme, que tem desde os mais caros aos mais baratos. Tem que andar bastante aqui pra não dar bobeira. Camden Town, como já tinha me dito meu amigo Leo Veiga, é a minha cara!!!

Agora estou começando a conhecer os pubs de inglês, porque os de turista são ridículos. Um conselho: se vcs vierem aqui, não vão ao Walkabout – só vão se forem tomar uma rápida ou assistir futebol, porque no final da semana fica uma farofa gringa que dá medo... É um bar – uma cadeia de bares, tipo o Amarelinho – de australianos e eles são bem grosseiros. Além disso, o bar nem é legal. Um dos eventos da escola é o karaokê do Walkabout Finchley Road, às quintas. Fui empolgada com minhas roomates – aliás, Katerina ficou pra trás porque tem 17 – achando que ia cantar muito e que ia ser o máximo. Nem precisa dizer que só tinha Britneys e Justins pulando e fazendo coreografias de dar inveja a qualquer macaco com hemorróida. Como se não bastasse, comprei uma pint – gente, quase uma garrafa de cerveja – e dois minutos depois um gorila gigantesco começou a querer me colocar pra fora. Como vocês devem saber, é proibido tomar qualquer bebida alcoólica na rua, e com isso eu disse que se tinham me vendido uma bebida lá dentro há um minuto, eu teria que poder tomá-la até acabar. Que isso, o gorila sem cérebro foi me EMPURRANDO para a porta, dizendo que eles estavam fechando e que ele não estava nem aí se eu estava bebendo ou não. Ou seja: não dêem dinheiro pra macaco, eles não sabem o que fazer com ele – em outras palavras, nunca vão a esse lugar!

Tô me achando aqui, tomando Guinness no boteco da esquina! O curso aos poucos tá ficando melhor, e todo dia tem caminhadas com os professores pra algum parque ou lugar mais tradicional nos arredores. Tem um cartão chamado Oyster que funciona em toda a cidade, e pagando semanalmente ou mensalmente - ou acho que até diariamente - você anda de metrô nas suas zonas de preferência e de ônibus pra todo lado. Essa é uma boa dica pra quem vier pra cá – vá até uma estação de metrô e compre o seu. Outra dica importantíssima: façam amizade com ingleses: além de o inglês deles ser perfeito (por que será?), eles vão te aplicar na boa e velha Londres. Já apareceram três lugares pra eu morar a partir de setembro e tô analisando as opções, principalmente porque a galera conta bastante.

Comecei a descobrir que aqui é um lugar muito legal porque, basicamente, se você fala inglês, você não precisa de ninguém pra te acompanhar a lugar nenhum! Dá uma sensação de independência incrível simplesmente pegar o metrõ, escolher uma estação, descer lá e começar a andar, achar um filme legal no cinema, entrar e assistir, sentar num parque pra ler, pegar um ônibus só pra tirar foto do segundo andar, entrar numa loja e fazer mil perguntas - os ingleses são meio chatos, mas a galera de outras nacionalidades, maioria absoluta aliás, é muito receptiva – principalmente os indianos e paquistaneses. Outra coisa ótima é que, como a cidade é enorme, sempre vai ter um lugar onde vc nunca foi. Caminhar aqui é otimo, porque os lugares são tão bonitos que a gente nem vê que está andando, e para melhorar ainda mais, a cidade é praticamente toda plana. Mas cuidado: andar de bicicleta, só se for mto experiente, não tiver medo de morrer ou no próprio bairro, em parques ou lugares do tipo, porque os ingleses são frenéticos no trãnsito – tipo a gente mesmo – , e o trânsito aqui é muito confuso. Eu que sou uma pessoa super corajosa e exímia ciclista, só de ver aquelas bicicletinhas disputando espaço com um double-decker bus, motos e carros em ruas que são quase tão estreitas quanto às de Ouro Preto, rezo para a padroeira dos bicicleteiros todos os dias.

O pessoal aqui em geral está sempre correndo, engolindo um sanduíche no metrô e correndo, correndo, exatamente como o coelho branco de Alice, olhando os relógios e nunca, jamais, pra outras pessoas. Inclusive, existe uma política aqui de que todo mundo deve ficar do lado direito da escada rolante, porque o lado esquerdo é pra quem quer ir mais rápido. Essa escada aliás é surreal, parece que vc tá entrando num túnel de um filme de ficção científica, umas quatro escadas com a galera correndo no meio, altasso, e sempre rolando um show ao vivo lá em baixo. Tem muita gente que canta no metrô. Sinceramente, se vendessem cerveja e tivesse banheiro, ficaria lá mesmo, porque os shows são geralmente bons.

Rolou festa de encerramento das olimpíadas na Trafalgar Square com fogos, telão, desfile, um show meio esquisito – sempre vão existir os fãs dessas coisas cult de gente seminua dançando de uma forma estranha com uma música tipo Bjork ao fundo -, no mínimo divertido. Ontem teve jogo de futebol aqui e pela primeira vez vi os Hooligans – ou o que restou deles. Eles começam a beber cedo, nem dá pra tentar acompanhar - até porque pensar no preço de uma pint em reais dá dor de cabeça... Como já dizia minha amiga Camilex, “quem converte não diverte!” Vamos ver por quanto tempo vou conseguir me divertir...

Um grande beijo e hasta lo próximo capítulo (portunhol rules!!!)

Errata: A Zara é a Zara mesmo, mas estava em liquidação, e liquidação aqui é de verdade, não como as do Brasil, em que as lojas colocam os preços originais como se estivessem com desconto e aumentam os que seriam os antigos pra gente achar que tem promoção. Ai, Brasil!

sábado, 17 de janeiro de 2009

Capítulo 3 - Carnaval de turista

Ei, gente,

Aí vai um resumo geral até agora:

1) Chove pra carácules;
2) Tudo é muito caro;
3) Os ingleses são estranhos - e só 10% deles mora aqui;
4) A cidade é bonitassa!

Continuando, ontem fui ao Camden Market, que é tipo uma feira hippie alternativa. O bairro em si – Camden Town – é muito legal. Cada estação de metrô ou trem representa uma região da cidade. Esse lugar, que a galera chama de Camden, é super alternativo, dá vontade de morar lá e comprar tudo. O problema é que parece que as coisas são baratas, mas é quase o quádruplo do preço aí. Camden foi o lugar onde vi punks pela primeira vez – e adorei o visual. Os bares são um barato, as roupas e sapatos nas lojas são diferentes demais, tudo maravilhoso, bem colorido, e o melhor é que você pode ser e fazer o que quiser, porque cada um está literalmente na sua, coisa chocante pra quem sai de Belo Horizonte, uma roça grande... E gente, aproveitando, muita atenção: o mercado legal mesmo não é o Camden Market, e sim o Camden Lock, um mercado parecido com um Mercado Central principalmente de roupas e acessórios, um pouco mais à frente. O Camden Lock é um antigo estábulo, e a diferença é que agora esse estábulo ganhou muitas barraquinhas, várias lojinhas descoladas com vendedores pra lá de interessantes. Do lado de fora existem barraquinhas de comidas – do mundo inteiro – e até topei com uma do Brasil vendendo PASTEL PORTUGUÊS, é mole? Se vocês ainda não se convenceram do quanto o lugar é bacana, uma informação importante: a Amy mora lá!!!

Na minha casa, as meninas são adolescentes turistas, só querem ir aos lugares designados pela escola e visitar os museus, igrejas, galerias, praças, tudo de uma vez. Ou seja: chato. Essa semana vou ver se começo a trabalhar e interagir com um pessoal local para saber qual é a boa dessa cidade. Aos poucos já estou me ambientando e descobrindo os lugares que gosto mais. Vou dar um perdido nessa galera e descobrir a minha Londres - não dizem que cada um tem a sua? Tô falando muito inglês, mas a cerva que é bom custa caro demais. Uma latinha custa tipo 12 reais - oba, vou ficar tão magrinha! Basta saber se a rainha da cerveja vai resistir... Que comecem as apostas!

Hoje fui ao 'carnaval' em Notting Hill, que mais parece uma oportunidade pras pessoas mostrarem como ão bregas – principalmente as mulheres! Parecia o carnaval do Jaspion – e ainda falam que é o carnaval mais tradicional da Europa... Simplesmente já começou com uma mulher no alto-falante gritando pra galera abrir espaço para os “carros alegóricos” passarem, alegando que caso isso não fosse feito, o carnaval não aconteceria. Estão imaginando? Engraçado demais... depois do desfile – no mínimo divertido, ainda mais pra uma brasileira -, as pessoas se dispersaram pela Portobello Road, a rua do mercado mais legal, que rola aos sábados, e no meio do caminho várias barraquinhas vendiam todo o tipo de comida e bebida. Em cada rua que corta a Portobello Road o quarteirão estava fechado com alguma atração musical. Agora atenção a elas: um quarteirão com techno no talo; outro com uma galera cantando hip-hop; um com umas músicas jamaicanas ou caribenhas, sabem esse tipo?... Se bobear tinha até uma banda de metal tocando lá e eu não vi. Como estava com meus coleguinhas comportados e dependendo do banheiro químico de dez em dez minutos por causa da minha cervejinha de sempre, acabei tendo que ir embora mais cedo, e soube que foi o melhor que podia ter acontecido, porque rolou a maior pancadaria depois. As mulheres trêbadas com tudo de fora se beijando pra ver se algum homem animava, os homens não animando nada, a galera das casas próximas cobrando pra usar o banheiro, as escadas intermináveis pra chegar ao banheiro, com umas portinhas no meio do caminho que soube mais tarde serem as casas das pessoas – ou seja, mil pessoas moram no mesmo lugar e se bobear ninguém se conhece, onde o elevador e a saída de incêndio mandaram um abraço - , polícia pra todo lado e jamaicanos e caribenhos curtindo a rodo, pois esses sim sabem se divertir: essas foram minhas impressões sobre o carnaval de Notting Hill.

Depois dou mais notícia.
Bjo e hasta!

Capítulo 3 - Carnaval de turista

Ei, gente,

Aí vai um resumo geral até agora:

1) Chove pra carácules;
2) Tudo é muito caro;
3) Os ingleses são estranhos - e só 10% deles mora aqui;
4) A cidade é bonitassa!

Continuando, ontem fui ao Camden Market, que é tipo uma feira hippie alternativa. O bairro em si – Camden Town – é muito legal. Cada estação de metrô ou trem representa uma região da cidade. Esse lugar, que a galera chama de Camden, é super alternativo, dá vontade de morar lá e comprar tudo. O problema é que parece que as coisas são baratas, mas é quase o quádruplo do preço aí. Camden foi o lugar onde vi punks pela primeira vez – e adorei o visual. Os bares são um barato, as roupas e sapatos nas lojas são diferentes demais, tudo maravilhoso, bem colorido, e o melhor é que você pode ser e fazer o que quiser, porque cada um está literalmente na sua, coisa chocante pra quem sai de Belo Horizonte, uma roça grande... E gente, aproveitando, muita atenção: o mercado legal mesmo não é o Camden Market, e sim o Camden Lock, um mercado parecido com um Mercado Central principalmente de roupas e acessórios, um pouco mais à frente. O Camden Lock é um antigo estábulo, e a diferença é que agora esse estábulo ganhou muitas barraquinhas, várias lojinhas descoladas com vendedores pra lá de interessantes. Do lado de fora existem barraquinhas de comidas – do mundo inteiro – e até topei com uma do Brasil vendendo PASTEL PORTUGUÊS, é mole? Se vocês ainda não se convenceram do quanto o lugar é bacana, uma informação importante: a Amy mora lá!!!

Na minha casa, as meninas são adolescentes turistas, só querem ir aos lugares designados pela escola e visitar os museus, igrejas, galerias, praças, tudo de uma vez. Ou seja: chato. Essa semana vou ver se começo a trabalhar e interagir com um pessoal local para saber qual é a boa dessa cidade. Aos poucos já estou me ambientando e descobrindo os lugares que gosto mais. Vou dar um perdido nessa galera e descobrir a minha Londres - não dizem que cada um tem a sua? Tô falando muito inglês, mas a cerva que é bom custa caro demais. Uma latinha custa tipo 12 reais - oba, vou ficar tão magrinha! Basta saber se a rainha da cerveja vai resistir... Que comecem as apostas!

Hoje fui ao 'carnaval' em Notting Hill, que mais parece uma oportunidade pras pessoas mostrarem como ão bregas – principalmente as mulheres! Parecia o carnaval do Jaspion – e ainda falam que é o carnaval mais tradicional da Europa... Simplesmente já começou com uma mulher no alto-falante gritando pra galera abrir espaço para os “carros alegóricos” passarem, alegando que caso isso não fosse feito, o carnaval não aconteceria. Estão imaginando? Engraçado demais... depois do desfile – no mínimo divertido, ainda mais pra uma brasileira -, as pessoas se dispersaram pela Portobello Road, a rua do mercado mais legal, que rola aos sábados, e no meio do caminho várias barraquinhas vendiam todo o tipo de comida e bebida. Em cada rua que corta a Portobello Road o quarteirão estava fechado com alguma atração musical. Agora atenção a elas: um quarteirão com techno no talo; outro com uma galera cantando hip-hop; um com umas músicas jamaicanas ou caribenhas, sabem esse tipo?... Se bobear tinha até uma banda de metal tocando lá e eu não vi. Como estava com meus coleguinhas comportados e dependendo do banheiro químico de dez em dez minutos por causa da minha cervejinha de sempre, acabei tendo que ir embora mais cedo, e soube que foi o melhor que podia ter acontecido, porque rolou a maior pancadaria depois. As mulheres trêbadas com tudo de fora se beijando pra ver se algum homem animava, os homens não animando nada, a galera das casas próximas cobrando pra usar o banheiro, as escadas intermináveis pra chegar ao banheiro, com umas portinhas no meio do caminho que soube mais tarde serem as casas das pessoas – ou seja, mil pessoas moram no mesmo lugar e se bobear ninguém se conhece, onde o elevador e a saída de incêndio mandaram um abraço - , polícia pra todo lado e jamaicanos e caribenhos curtindo a rodo, pois esses sim sabem se divertir: essas foram minhas impressões sobre o carnaval de Notting Hill.

Depois dou mais notícia.
Bjo e hasta!

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Capítulo 2 - A Saga

Ei, gente,

Nessa cidade só chove mesmo, impressionante, mas não tá frio, não. Hoje, por exemplo, rolou um solão! Vi o Big Ben, Picadilly Circus, Trafalgar Square, London Eye e River Thames numa andada só, foi muito legal, mas a planta não tinha levado a máquina, então... Na verdade, nem poderia, porque a situação foi simplesmente fantástica.

Minha amiga Marina trabalha em um pub chamado The Square Pig, que fica em Holborn. Holborn é uma estação bem central, bem pertinho do Soho e de outros locais badalados e turísticos aqui. Bem, Marina me convidou pra conhecer o pub em meu segundo dia londrino, e eu adorei a idéia de tomar minha primeira pint num local não-turístico (afinal, gente de outros países a gente fica a fim de ver quando resolve ir até eles, né verdade?). Lá fui eu, e para tornar o programa ainda mais interessante, liguei para meu amigo Germano, super divertido e alto-astral, que topou na hora e em pouco tempo já estava lá brindando comigo à minha chegada e às nossas futuras aventuras. Tomamos um bocado e nos animamos completamente, mas soubemos que o pub fecharia em instantes. Com o intuito de curtir a noite, lá fomos nós procurar algo pra fazer depois das dez em plena terça-feira. Depois de perguntar a transeuntes dos mais variados, descobrimos que um club chamado AKA, ou The End, lá perto de onde estávamos, era o point da noite. Lá fomos nós, e chegando lá, meu amigo, um brasileiro que mais parece italiano, com charme de sobra e um inglês muito bem-falado, já começou a despertar olhares assanhados de gatinhas que nem queriam saber se ele estava acompanhado. Resultado: Germanito foi quase que abduzido pelas gringas e uma mala sem alça se instalou do meu lado! Como eu percebi que nada o faria sair dali – coitado, não tinha alça também, quem é que iria resgatá-lo? -, dei o velho golpe do banheiro e evacuei a área! Só queria sair dali, e quis tanto, mas tanto que acabei andando sem rumo, à noite, numa cidade onde só sabia o meu endereço porque andava com ele anotado em um papelzinho na bolsa. Bem, liguei pro Germano, mas com toda aquela sonzeira e atrações à parte, ia ser difícil ele me ouvir. Já estava pensando em como ir embora, quando se aproxima de mim uma figura muito peculiar e me pergunta: você está perdida? Acho que não tava dando pra esconder... Ela então me disse: eu estou com uns problemas, acabei de brigar com meu namorado e estou a fim de andar um pouco. Anima? Que isso, uma menina rasta, das Ilhas Seychelles – vim saber depois que ficam na África, ao norte de Madagascar – fazendo faculdade em Engenharia Ambiental em Londres há dois anos cai de pára-quedas na minha andança e ME CHAMA PRA ANDAR MAIS? Claro que eu fui. Andamos a noite toda, e ela me levou a todos os pontos turísticos mais conhecidos – Picadilly Circus, Trafalgar Square, Big Ben, London Bridge, London Eye, uma ponte para pedestres chamada Millenium Bridge e mais uns lugares que eu deveria ter anotado o nome. Era como se eu estivesse em um sightseeing com uma guia super descolada e divertida, durante a madrugada! No meio da nossa jornada, ela me contou que não gostava de Londres e que estava contando os dias para terminar a faculdade e voltar pra sua casa; que falava francês no seu país; que namorava um espanhol que dava trabalho porque era mais novo e sem nenhum expediente (palavras de minha sábia mãe, que significam “parasita preguiçoso sem limites”); ah, e que morava num squat. Gente, vcs sabem o que é um squat? Alguns prédios ou galpões são fechados sabe-se lá por que e a galera invade e passa a morar lá. Não sei bem, mas parece que a polícia só pode te tirar de lá se você for pego em flagrante tentando invadir, mas não depois que você já está lá dentro. Olha que coisa... Minha mais nova amiga me explicou tudo isso, e disse que muitas vezes não dá pra você escolher as pessoas que moram no seu squat, o que significa que na casa dela moravam também alguns junkies - viciados em cocaína e heroína – que às vezes davam problema. Pensei comigo: nuuuuuuuuu, imagina o problema que esse pessoal deve dar! Obrigada, Senhor, pela minha casinha! Andamos e conversamos tanto que quando olhei pro relógio, já estava na hora de o metrô voltar a passar. Ela me ensinou como não pagar metrô – entrando junto com outra pessoa antes de a “porta” fechar – e disse que nunca pagava transporte. Tudo bem, mas eu, com esse jeito desengonçado e nem um pouco espertinho, vi que acabaria deportada se tentasse algo parecido... Ela me deu seu telefone e disse que se chamava JP – nunca vou saber se entendi certo esse nome... Voltei pra casa pensando que essa cidade é muito doida mesmo!

Aqui na escola a internet tá sempre lotada, o computador é bloqueado pra abrir fotos e não dá pra mandar também. Vou esperar pra tirar mais fotos legais e aí vou a uma internet paga pra mandar pra vcs. No mais, tá tudo tranquilo. Ainda não consegui me entender com os ônibus, e o último metrô é às 11h em algumas estações, 00h nas outras. Os pubs fecham as 10, 10 e pouco durante a semana, muito estranho – bem, isso foi o que me disseram, e o jeito vai ser conferir... Minha primeira pint foi bem legal. As bebidas de shots (doses) mais tomadas aqui são tipo Bailey's, mais do que tequila ou coisas do tipo – pelo menos no Square Pig... Muita gente toma vinho. Tem uma menina francesa e outra tcheca na minha casa – Lucy e Katerina –, e estamos tentando acompanhar as visitas turisticas da escola pra interagir com a galera. A comida e o transporte são caros, mas as roupas são baratassas, tô tendo que me conter bastante pra não dar derrame antes de arrumar um emprego! Andar a pé só é possível no seu bairro, tudo eh lonjasso! Vou fazer uma visita ao Stone Henge e outra a Notredame esse fim de semana com a escola, e depois conto pra vocês como foi.

Bjos a todos, saudades!

Adendo: Não rolou a viagem – ressaca...

Capítulo 2 - A Saga

Ei, gente,

Nessa cidade só chove mesmo, impressionante, mas não tá frio, não. Hoje, por exemplo, rolou um solão! Vi o Big Ben, Picadilly Circus, Trafalgar Square, London Eye e River Thames numa andada só, foi muito legal, mas a planta não tinha levado a máquina, então... Na verdade, nem poderia, porque a situação foi simplesmente fantástica.

Minha amiga Marina trabalha em um pub chamado The Square Pig, que fica em Holborn. Holborn é uma estação bem central, bem pertinho do Soho e de outros locais badalados e turísticos aqui. Bem, Marina me convidou pra conhecer o pub em meu segundo dia londrino, e eu adorei a idéia de tomar minha primeira pint num local não-turístico (afinal, gente de outros países a gente fica a fim de ver quando resolve ir até eles, né verdade?). Lá fui eu, e para tornar o programa ainda mais interessante, liguei para meu amigo Germano, super divertido e alto-astral, que topou na hora e em pouco tempo já estava lá brindando comigo à minha chegada e às nossas futuras aventuras. Tomamos um bocado e nos animamos completamente, mas soubemos que o pub fecharia em instantes. Com o intuito de curtir a noite, lá fomos nós procurar algo pra fazer depois das dez em plena terça-feira. Depois de perguntar a transeuntes dos mais variados, descobrimos que um club chamado AKA, ou The End, lá perto de onde estávamos, era o point da noite. Lá fomos nós, e chegando lá, meu amigo, um brasileiro que mais parece italiano, com charme de sobra e um inglês muito bem-falado, já começou a despertar olhares assanhados de gatinhas que nem queriam saber se ele estava acompanhado. Resultado: Germanito foi quase que abduzido pelas gringas e uma mala sem alça se instalou do meu lado! Como eu percebi que nada o faria sair dali – coitado, não tinha alça também, quem é que iria resgatá-lo? -, dei o velho golpe do banheiro e evacuei a área! Só queria sair dali, e quis tanto, mas tanto que acabei andando sem rumo, à noite, numa cidade onde só sabia o meu endereço porque andava com ele anotado em um papelzinho na bolsa. Bem, liguei pro Germano, mas com toda aquela sonzeira e atrações à parte, ia ser difícil ele me ouvir. Já estava pensando em como ir embora, quando se aproxima de mim uma figura muito peculiar e me pergunta: você está perdida? Acho que não tava dando pra esconder... Ela então me disse: eu estou com uns problemas, acabei de brigar com meu namorado e estou a fim de andar um pouco. Anima? Que isso, uma menina rasta, das Ilhas Seychelles – vim saber depois que ficam na África, ao norte de Madagascar – fazendo faculdade em Engenharia Ambiental em Londres há dois anos cai de pára-quedas na minha andança e ME CHAMA PRA ANDAR MAIS? Claro que eu fui. Andamos a noite toda, e ela me levou a todos os pontos turísticos mais conhecidos – Picadilly Circus, Trafalgar Square, Big Ben, London Bridge, London Eye, uma ponte para pedestres chamada Millenium Bridge e mais uns lugares que eu deveria ter anotado o nome. Era como se eu estivesse em um sightseeing com uma guia super descolada e divertida, durante a madrugada! No meio da nossa jornada, ela me contou que não gostava de Londres e que estava contando os dias para terminar a faculdade e voltar pra sua casa; que falava francês no seu país; que namorava um espanhol que dava trabalho porque era mais novo e sem nenhum expediente (palavras de minha sábia mãe, que significam “parasita preguiçoso sem limites”); ah, e que morava num squat. Gente, vcs sabem o que é um squat? Alguns prédios ou galpões são fechados sabe-se lá por que e a galera invade e passa a morar lá. Não sei bem, mas parece que a polícia só pode te tirar de lá se você for pego em flagrante tentando invadir, mas não depois que você já está lá dentro. Olha que coisa... Minha mais nova amiga me explicou tudo isso, e disse que muitas vezes não dá pra você escolher as pessoas que moram no seu squat, o que significa que na casa dela moravam também alguns junkies - viciados em cocaína e heroína – que às vezes davam problema. Pensei comigo: nuuuuuuuuu, imagina o problema que esse pessoal deve dar! Obrigada, Senhor, pela minha casinha! Andamos e conversamos tanto que quando olhei pro relógio, já estava na hora de o metrô voltar a passar. Ela me ensinou como não pagar metrô – entrando junto com outra pessoa antes de a “porta” fechar – e disse que nunca pagava transporte. Tudo bem, mas eu, com esse jeito desengonçado e nem um pouco espertinho, vi que acabaria deportada se tentasse algo parecido... Ela me deu seu telefone e disse que se chamava JP – nunca vou saber se entendi certo esse nome... Voltei pra casa pensando que essa cidade é muito doida mesmo!

Aqui na escola a internet tá sempre lotada, o computador é bloqueado pra abrir fotos e não dá pra mandar também. Vou esperar pra tirar mais fotos legais e aí vou a uma internet paga pra mandar pra vcs. No mais, tá tudo tranquilo. Ainda não consegui me entender com os ônibus, e o último metrô é às 11h em algumas estações, 00h nas outras. Os pubs fecham as 10, 10 e pouco durante a semana, muito estranho – bem, isso foi o que me disseram, e o jeito vai ser conferir... Minha primeira pint foi bem legal. As bebidas de shots (doses) mais tomadas aqui são tipo Bailey's, mais do que tequila ou coisas do tipo – pelo menos no Square Pig... Muita gente toma vinho. Tem uma menina francesa e outra tcheca na minha casa – Lucy e Katerina –, e estamos tentando acompanhar as visitas turisticas da escola pra interagir com a galera. A comida e o transporte são caros, mas as roupas são baratassas, tô tendo que me conter bastante pra não dar derrame antes de arrumar um emprego! Andar a pé só é possível no seu bairro, tudo eh lonjasso! Vou fazer uma visita ao Stone Henge e outra a Notredame esse fim de semana com a escola, e depois conto pra vocês como foi.

Bjos a todos, saudades!

Adendo: Não rolou a viagem – ressaca...

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Londres: A Saga/ Capítulo 1 - Primeiro dia de verdade

Minha viagem a Londres, como todas as coisas que acontecem em minha vida, foi um evento... digamos assim... SURREAL! Os capítulos a seguir foram inicialmente e-mails enviados a amigos contando algumas impressões bem pessoais sobre a terra de tia Beth. Enjoy!

CAPÍTULO 1: PRIMEIRO DIA DE VERDADE


Oi, gente,
Hoje foi o primeiro dia em que eu andei de metrô (sozinha!) e vim para a aula. A dona da casa onde tô ficando é muito estranha, mas tranquilo - daqui a um mês eu saio de lá. Encontrei a Marina (amiga minha que mora aqui) ontem e dormi na casa dela, foi ótimo. Hoje vou encontrar o Germano, meu outro amigo daí de BH. O bairro onde estou é muito lindo, super tradicional, mas aqui até a periferia é bonita - as casinhas são fofas, todas iguaizinhas, e sempre com dois andares! Dá pra achar tudo fácil, e o metrô é ótimo, super didático e muito eficiente – em todas as estações a gente pode pegar um guia que mostra todas as linhas, e lá dentro tudo é minuciosamente explicado, desde direções a origem e destino.
Vou a pé pra escola, mas pra tudo aqui tenho que andar bastante - o perto é tipo meia hora no mínimo de caminhada. Até bom que eu faço um exercício, hehehe... a aula foi bem interessante, mas fiquei um pouco sem graça porque até a coordenadora da escola me disse que não tem curso pro meu nível de inglês, que é mais alto que o de muitos nativos!!! Surreal, né? Acho que meu inglês tá bom mesmo – levando-se em consideração, é claro, meu sotaque mega belo horizontino – , tô conversando bastante com todo mundo que eu conheco e que não conheço, e as pessoas tão falando isso, muito legal. O meu professor vai me emprestar o “Cem anos de solidao” em inglês, olha que máximo! Ainda não deu pra ir aos lugares turisticos, mas pretendo ir no fim de semana. Quando tiver fotos de lugares legais mando pra vcs. Fiquei igual a uma roceira aqui, tirando foto até de dentro do táxi, mas quero levar pros meus alunos pra eles verem como é de verdade...
Bem, afetações – infinitas – à parte, talvez deva começar a procurar emprego amanhã, e espero dar notícias mais bacanas nos próximos dias. Aqui na escola é uma loucura, cada um conversando em uma língua nos corredores. Não sei se o pessoal aqui é meio arredio ou se os brasileiros é que são dados demais pra estranhar um povo mais reservado. Fato é que ninguém puxa assunto; em compensação, quando alguém toma a iniciativa, todo mundo começa a falar sem parar, como se só estivessem à espera de um ser vivo qualquer para quebrar o gelo. Nem precisa dizer que numa dessas tagarelices, iniciadas pela figura aqui, descobri que uma das meninas do papo morava na minha casa! “Nossa, a dona da minha casa é muito estranha.” “É, a minha também.” “A casa é cheia de avisos colados por todo lado.” “Nossa, é a mesma coisa na minha”. “Eu nem bem cheguei e ela já foi ditando mil regras e me levou pra fora da casa pra mostrar os pontos de ônibus e o caminho da escola, e ainda por cima disse que seria melhor pra mim sair andando pela vizinhança pra me familiarizar com o ambiente, sendo que eu tinha acabado de chegar!” “Comigo aconteceu aa mesma coisa, e pra completar ela não deixa usar a cozinha – nem guardar coisas na geladeira vai ser possível... “ “Só falta agora vc dizer que mora na 45 CR”. Ela sorriu e disse: “Muito prazer, sou Lucy, sua flatmate.” Tive que rir...
É muita informação, mas tô gostando. Ah, a Pringles custa só £1.29!!! Já sei o que vou comer até o fim da viagem!
Beijos a todos e até o próximo capítulo!

Londres: A Saga/ Capítulo 1 - Primeiro dia de verdade

Minha viagem a Londres, como todas as coisas que acontecem em minha vida, foi um evento... digamos assim... SURREAL! Os capítulos a seguir foram inicialmente e-mails enviados a amigos contando algumas impressões bem pessoais sobre a terra de tia Beth. Enjoy!

CAPÍTULO 1: PRIMEIRO DIA DE VERDADE


Oi, gente,
Hoje foi o primeiro dia em que eu andei de metrô (sozinha!) e vim para a aula. A dona da casa onde tô ficando é muito estranha, mas tranquilo - daqui a um mês eu saio de lá. Encontrei a Marina (amiga minha que mora aqui) ontem e dormi na casa dela, foi ótimo. Hoje vou encontrar o Germano, meu outro amigo daí de BH. O bairro onde estou é muito lindo, super tradicional, mas aqui até a periferia é bonita - as casinhas são fofas, todas iguaizinhas, e sempre com dois andares! Dá pra achar tudo fácil, e o metrô é ótimo, super didático e muito eficiente – em todas as estações a gente pode pegar um guia que mostra todas as linhas, e lá dentro tudo é minuciosamente explicado, desde direções a origem e destino.
Vou a pé pra escola, mas pra tudo aqui tenho que andar bastante - o perto é tipo meia hora no mínimo de caminhada. Até bom que eu faço um exercício, hehehe... a aula foi bem interessante, mas fiquei um pouco sem graça porque até a coordenadora da escola me disse que não tem curso pro meu nível de inglês, que é mais alto que o de muitos nativos!!! Surreal, né? Acho que meu inglês tá bom mesmo – levando-se em consideração, é claro, meu sotaque mega belo horizontino – , tô conversando bastante com todo mundo que eu conheco e que não conheço, e as pessoas tão falando isso, muito legal. O meu professor vai me emprestar o “Cem anos de solidao” em inglês, olha que máximo! Ainda não deu pra ir aos lugares turisticos, mas pretendo ir no fim de semana. Quando tiver fotos de lugares legais mando pra vcs. Fiquei igual a uma roceira aqui, tirando foto até de dentro do táxi, mas quero levar pros meus alunos pra eles verem como é de verdade...
Bem, afetações – infinitas – à parte, talvez deva começar a procurar emprego amanhã, e espero dar notícias mais bacanas nos próximos dias. Aqui na escola é uma loucura, cada um conversando em uma língua nos corredores. Não sei se o pessoal aqui é meio arredio ou se os brasileiros é que são dados demais pra estranhar um povo mais reservado. Fato é que ninguém puxa assunto; em compensação, quando alguém toma a iniciativa, todo mundo começa a falar sem parar, como se só estivessem à espera de um ser vivo qualquer para quebrar o gelo. Nem precisa dizer que numa dessas tagarelices, iniciadas pela figura aqui, descobri que uma das meninas do papo morava na minha casa! “Nossa, a dona da minha casa é muito estranha.” “É, a minha também.” “A casa é cheia de avisos colados por todo lado.” “Nossa, é a mesma coisa na minha”. “Eu nem bem cheguei e ela já foi ditando mil regras e me levou pra fora da casa pra mostrar os pontos de ônibus e o caminho da escola, e ainda por cima disse que seria melhor pra mim sair andando pela vizinhança pra me familiarizar com o ambiente, sendo que eu tinha acabado de chegar!” “Comigo aconteceu aa mesma coisa, e pra completar ela não deixa usar a cozinha – nem guardar coisas na geladeira vai ser possível... “ “Só falta agora vc dizer que mora na 45 CR”. Ela sorriu e disse: “Muito prazer, sou Lucy, sua flatmate.” Tive que rir...
É muita informação, mas tô gostando. Ah, a Pringles custa só £1.29!!! Já sei o que vou comer até o fim da viagem!
Beijos a todos e até o próximo capítulo!

domingo, 11 de janeiro de 2009

Uma menina que se chamava Amanda

Era uma vez uma menina que se chamava Amanda. Ela morava com os pais num apartamento bem apertadinho, mas tão pequenininho que nem tinha lugar pra ela brincar. Mesmo quando ela encontrava um cantinho e se sentava com suas bonecas, logo ficava desanimada, pois não havia ninguém para brincar com ela. Ah, e como Amanda gostava de brincar...

Por isso, Amanda adorava a escola: grande, cheia de amigos, brincadeiras, árvores e até bichos. Amanda passava o dia todo na escola, porque os pais trabalhavam muito. Todos os dias, ela era acordada por Neuza, sua única amiga neste apertamento, como ela sempre dizia. Esqueci de dizer que Amanda era uma menina por demais inteligente, que vivia brincando com a língua, inventando palavras e questionando tudo à sua volta. Pois bem, a velha amiga Neuza arrumava seu café e o especial a levava para a escola. Durante o café: “Já sabe, né, Amanda, nada de muita conversa...” e ela completava: “...’porque seu pai e sua mãe trabalham demais e precisam dormir’, já sei, Neuzinha, ‘deixa pra tagarelar na escola’, não é assim?” E Neuza balançava a cabeça e emendava com um sorriso: “Essa menina...”

Amanda se divertia muito na escola, e  a cada dia queria aprender mais e mais. Sempre muito alegre, era o xodó da Augusta da cantina, do seu Pedro da portaria, do disciplinário Jorge Altão – apelido dado pelos meninos porque Jorge era mesmo bem altão – e de suas professoras, todas encantadas com aquela menina que fazia poesia e cantava o Faroeste de Caboclo melhor que o mestre Renato Russo no ápice de seus 8 anos. Assim era Amanda: corria, sonhava, fazia e acontecia, criava mundos diferentes e gostava de ler e escrever. Amanda gostava de viver, e era feliz. Bem, até chegar em sua casa.

Às cinco e meia, Amanda se despedia de todos na escola e lá estava seu Dagoberto pra levá-la para casa. No especial, Amanda cantava músicas, recitava poemas, ria das piadas dos amigos – mesmo das que não entendia, porque não ficava bem admitir que não tinha entendido a piada -, era uma festa! Quando o especial dobrava a esquina, ela avistava sua única amiga no apertamento esperando de chinelos, avental e touca no cabelo, que a recebia com um sorriso no rosto largo e perguntava sobre as aventuras do dia. Amanda seguia o mesmo ritual: dava a merendeira para Neuza, guardava a mochila no quarto, tomava seu banho, colocava uma das roupas da pilha “roupas de casa” – isso mesmo: o guarda-roupas de Amanda era cheio de etiquetas dizendo pra que as roupas serviam –, jantava na cozinha com sua amiga e escovava os dentes. Em seguida, ela fazia o dever de casa no quarto, e seus pais sempre chegavam a essa hora.

Todos os dias, era a mesma coisa: “Oi, Amanda. Comeu? Tomou banho? Fez o dever de casa? Puxa, que dia cansativo! Vou tomar meu banho, comer alguma coisa e já venho falar com você.” Essa era a mãe. Pouco tempo depois, chegava o pai. “Oi, Amanda. Comeu? Tomou banho? Fez o dever de casa? Puxa, que dia cansativo! Vou tomar meu banho, comer alguma coisa e já venho falar com você.” E todos os dias Amanda fazia o dever de casa o mais bonito e caprichado que podia, e ficava esperando o pai ou a mãe vir ver. Mas nenhum vinha. Ela pegava seu caderno brochurão e ia até a sala para mostrar o para casa para o pai. Ele dizia a mesma coisa: “Amanda, não vê que estou ocupado agora? Estou assistindo ao jornal”. Amanda pedia desculpas e voltava para o quarto, pois sabia que o horário do jornal era o momento em que a mãe se empetecava de cremes, um após o outro, sempre em frente ao espelho, repetindo: “Eu sou uma pessoa bonita. Eu sou uma pessoa muito bonita”. Assim que o jornal acabava, Amanda corria cheia de esperança para o quarto da mãe, que dizia a mesma coisa: “Amanda, não vê que estou ocupada? Agora é hora da novela” e se sentava à frente da televisão. Não era permitido nenhum tipo de ruído nesse momento, e Amanda voltava para o quarto murchinha como uma planta que ninguém rega. E ficava sozinha. Bem, mais ou menos. É que Amanda tinha um passatempo muito gostoso: ler. Ela lia, lia, lia suas revistinhas da turma da Mônica, seus livros de contos e os poemas mais lindos de Cecília Meirelles. E sonhava. Em seus sonhos, seus pais passeavam com ela, brincavam com suas bonequinhas no cantinho do seu apertamento, sorriam, abraçavam e beijavam sua filhinha... Acordava às seis da manhã com um cafuné de Neuza. E não entendia porque as histórias dos livros eram tão diferentes da sua. E começava tudo de novo. Nos finais de semana, os pais estavam sempre muito cansados para ela, e dormiam muito, saíam bem tarde e dormiam muito de novo. E Amanda rezava para chegar logo a segunda-feira, e com ela a escola.

Um dia, depois de muito pensar, pensar e quase quebrar sua cabecinha pensando, Amanda descobriu uma maneira de ficar mais tempo com seus pais: assistindo televisão! Era só sentar-se no sofá e ficar bem quietinha. Quem sabe se nos intervalos do jornal o pai perguntaria como foi a escola ou pediria para ver seu trabalhinho de artes? Quem sabe se nos intervalos da novela a mãe pentearia seus cabelos ou pediria para ver alguma de suas bonecas? E assim ela ia, cheia de esperança, até o sofá, carregando o pente, a boneca e o trabalhinho, e se sentava em silêncio. E esperava até a propaganda, mas qual! A propaganda também era importante, e ela concluiu que não se podia falar enquanto a televisão estivesse ligada. De jeito maneira, simples assim. E assim Amanda passava suas noites: sentava-se ao lado do pai e da mãe, e assistia ao jornal e à novela. Foi aí que o mundo de Amanda começou a mudar. Ela via pessoas chorando no jornal e muitas maldades na novela. A menina sonhadora e alegre abandonou seus livros e histórias para mergulhar num universo chamado “novela das oito”, depois de acompanhar as catástrofes da vida real no jornal nacional. Ela pensava, pensava, mas não entendia porque as pessoas faziam aquelas coisas horríveis umas com as outras, e nem porque Deus deixava enchentes levarem casas, furacões destruírem cidades e tsunamis afogarem tanta gente. Por que as histórias dos livros eram tão diferentes das que via na televisão? Mas o que Amanda não entendia mesmo era por que seus pais ficavam tão vidrados assistindo a toda aquela tristeza.

Na novela, Amanda via pais que não gostavam dos filhos, filhos que não gostavam dos pais e todo o tipo de crueldade. Nesse novo universo, as pessoas mentiam, faziam as outras ficarem tristes e as coisas feias não tinham limites. Não foi difícil para nossa pequena amiga chegar à seguinte conclusão: MEUS PAIS NÃO GOSTAM DE MIM. Eles não se importam comigo, preferem ver essas coisas feias a ficar comigo, e gostam de assistir a esses pais que não gostam dos filhos e que fazem maldade com eles na televisão...

Puxa, como ficou apertado o coraçãozinho de Amanda depois daquela descoberta! Contou para Neuza, que só disse “deixa de bobagem, Amanda”, mas não conseguiu convencer a menina do contrário. Tudo fazia sentido para ela – o que estava na novela e no jornal era a mais pura verdade, os seus livrinhos eram bobos e só tinham historinhas de mentira. Agora ela não acreditava mais em Papai Noel, nem no coelhinho da Páscoa, e nem mesmo na Fada do Dente. Que tristeza!

Amanda ficou triste, chorou, chorou, e um dia decidiu: não iria gostar dos pais também. Não quis mais mostrar os trabalhinhos, não quis mais fazer os deveres caprichados e disse à professora Inês que não apresentaria mais o poema de homenagem às mães na próxima semana. Engolia o jantar e fazia o dever o mais rápido possível, só para se enfiar na cama e fingir estar dormindo quando os pais chegassem do trabalho. A mãe corria à cozinha preocupada: “Neuza, Amanda está doente?” O pai ia ao quarto de Amanda, sempre escuro, e corria à mãe, preocupado: “O que essa menina tem, meu Deus?” Neuza se limitava a dizer: “Culpa dessa televisão...”. Ninguém entendia nada. Os dois davam de ombros e voltavam a assistir a seus programas preferidos.

Um dia, a professora Inês, preocupada e disposta a animar sua melhor aluna de português, preparou uma aula muito interessante sobre nomes. Ela levou um livro bem grande para a sala e mostrou aos alunos o significado do nome de cada um. Os meninos se animaram bastante: Pedro rolou de rir quando descobriu que seu nome significava “pedra”, Érika se gabou ao saber que seu nome significava “poderosa como uma águia”, e Marina achou muito legal seu nome significar “do mar”, já que ela gostava bem de uma praia. Amanda olhou o dela: “digna de ser amada”. Achou estranho, não entendeu muito bem e já ia desistir de entender quando a professora Inês lançou o desafio: como dever de casa, os alunos deveriam perguntar aos pais por que eles haviam escolhido os seus nomes. E agora, o que Amanda iria fazer? “Ai, meu Deus, vou ter que conversar com meus pais”, pensou. Pediu à professora para fazer uma pesquisa na internet, sugeriu perguntar aos pais de sua vizinha, também chamada Amanda, mas ela foi categórica: “essa pesquisa tem que ser feita com os seus pais”.

Amanda respirou fundo e voltou para casa pensativa. Não cantou músicas, não recitou poemas e nem riu das piadas dos amigos. Não tagarelou no jantar, como costumava fazer, e dessa vez foi Neuza quem estranhou: “Amanda, o que é que você tem, menina?” Amanda explicou o problema à amiga, que só disse “Deus escreve certo por linhas tortas”. Ah, essa Amanda não entendeu mesmo. Coçou a cabeça e olhou pra Neuza confusa. “Um dia você vai entender, Amanda, um dia você vai entender”...

É, o jeito era mesmo encarar a fera – ou seja, o jeito era conversar com seus pais. Jantou e foi para o quarto aflita, ensaiando na frente do espelho o que iria dizer. Nesse dia, os pais de Amanda chegaram juntos em casa, e foram direto ao quarto da filha. Antes de abrirem a boca, a menina começou: “Oi, pai; oi, mãe. A professora Inês pediu que perguntássemos uma coisa aos pais para uma pesquisa, e como é para amanhã, vou perguntar agora e depois vocês podem tomar um banho, comer alguma coisa e assistir televisão.” Os pais de Amanda, surpresos, não sabiam o que dizer. Ela aproveitou a chance, pegou o lápis e o caderno, sentou-se na cama e continuou: “É só uma pergunta: por que vocês decidiram me chamar de Amanda?” Ela então se preparou para anotar a resposta, e qual não foi a sua surpresa ao ver seus pais com os olhos marejados de lágrimas, olhando para a menina com tanta ternura que ela nem conseguia acreditar! Os pais de Amanda se sentaram na cama, cada um de um lado. A mãe pegou o lápis da pequena mão da filha e escreveu no caderno brochurão:

AMANDA

Nossa amiguinha não entendeu patavinas, e já ia começar a perguntar quando a mãe explicou: “Eu e seu pai escolhemos esse nome para você porque dentro dele existem três palavrinhas que dizem como queríamos nossa filhinha: alguém que AMA as pessoas e os animais, a natureza e a vida; que MANDA em seu destino e escolhe seu próprio caminho; e que sempre será, acima de tudo, muito AMADA.” A mãe de Amanda começou a chorar e a abraçou forte. O pai acariciou-lhe os cabelos e beijou suas trêmulas mãozinhas. Seria um sonho? Amanda, com uma vozinha que quase não saía de tanta emoção, perguntou tímida: “Uai... mas vocês gostam de mim?” Ao que os pais riram e responderam: “Claro, minha filha, que pergunta é essa?” Amanda sentiu um frio na barriga, e ficou com medo que aquele momento acabasse, e pensou que os pais iriam acabar brigando com ela porque ela falava demais, e começou a ficar brava com ela mesma por sempre querer saber de tudo. Pensou, olhou para os rostos confusos do pai e da mãe, e resolveu que ela tinha que saber. “Eu achei que vocês não gostavam de mim, porque os programas que vocês assistem na televisão são cheios de famílias que brigam e pais e mães que não gostam dos seus filhos. Vocês não olham o meu dever de casa, nunca viram meus trabalhinhos de artes e nem sabem que a minha professora acha muito legal os poemas que eu escrevo. Vocês não me levam para passear e nem brincam comigo. Puxa, vocês nem conversam comigo, sabe? Parece que vocês gostam mais da televisão do que de mim...” O queixinho de Amanda ficou trêmulo e uma lágrima rolou do seu rostinho redondo. Os pais não sabiam o que dizer. O pai pegou a menina pela mão e começou, muito emocionado: “Você tem razão, Amanda. Nós estamos sempre tão cansados que nunca temos tempo pra você, né? Todos os dias eu digo que vou falar com você e vou assistir televisão. Só agora percebi que você começou a assistir televisão pra ficar perto da gente, pelo menos um pouquinho...” e não conseguiu continuar. A mãe de Amanda segurou seu rostinho redondo, limpou a outra lágrima que caía e disse: “Minha Amanda, você é tão especial, muito mais do que eu e seu pai sonhamos! Você nos enche de orgulho, e essa correria de todo dia fez a gente se esquecer de te mostrar o quanto te amamos... fez a gente se esquecer que você é uma criança, que gosta de brincar, tomar sorvete, passear no parque, que precisa de carinho e atenção. Nós te amamos muito, e prometo que vamos nos lembrar de regar nossa plantinha todos os dias.” Os três ficaram ali, abraçados, por um longo tempo. Foi o abraço mais gostoso da vida de Amanda, e ela ficou feliz demais, porque sabia que a plantinha era ela.

No dia seguinte, uma surpresa: os pais de Amanda vieram acordá-la com um beijo e um café bem gostoso. O pai disse que daquele dia em diante iria levá-la à escola. Nem precisa dizer que nossa amiguinha era só sorrisos na aula de português. Contou animada aos colegas e à professora sobre a escolha de seu nome, e no final da aula perguntou se ainda poderia recitar o poema do dia das mães. A professora Inês ficou muito animada, e disse que não tinha dado o poema a mais ninguém, pois sabia que ela acabaria mudando de idéia. Percebendo a mudança de Amanda depois do trabalhinho, a professora pensou alto: “Deus escreve certo por linhas tortas.” Dessa vez ela entendeu: Deus escrever por linhas tortas era uma coisa ótima.

Amanda voltou para casa feliz da vida e contou a Neuza tudo que tinha acontecido. A amiga sorriu e gostou muito das novidades, mas ainda estava preocupada: e a televisão? Amanda deu a merendeira para Neuza, guardou a mochila no quarto, tomou seu banho, colocou uma das roupas da pilha “roupas de casa” – caso vocês não se lembrem, o guarda-roupas de Amanda era cheio de etiquetas dizendo pra que as roupas serviam –, jantou na cozinha com sua amiga e escovou os dentes. Acabou tudo isso e foi para o quarto fazer seu dever de casa, aflita, sem saber o que a esperava.

Os pais de Amanda chegaram juntos, com algumas sacolas nas mãos. Entraram no quarto, deram um beijo na filha e entregaram as sacolas. Sem entender muito bem, Amanda abriu as sacolas e quase teve um troço quando viu o que tinha dentro: livros! Muitos livros! Toda a coleção da Casa Amarela, com Rubião Gatão, Leiloca Gatoca e outros felinos em histórias que mexiam com sua imaginação. Para Gostar de Ler, com muitas aventuras contadas por Monteiro Lobato. Os Três Porquinhos Pobres, uma história pra lá de divertida do Érico Veríssimo. E um livro bem grande, chamado “A História Sem Fim” – “esse é pra você ler daqui a um tempo, minha filha, pra nunca deixar de sonhar”, a mãe disse. Os olhos de Amanda brilhavam, e o pai anunciou que todos os dias ele e a mãe leriam uma história para ela. No ápice de seus 8 anos, Amanda pulou de felicidade, e para sempre sentiu-se a menina mais sortuda do mundo, simplesmente porque se chamava Amanda.

Uma menina que se chamava Amanda

Era uma vez uma menina que se chamava Amanda. Ela morava com os pais num apartamento bem apertadinho, mas tão pequenininho que nem tinha lugar pra ela brincar. Mesmo quando ela encontrava um cantinho e se sentava com suas bonecas, logo ficava desanimada, pois não havia ninguém para brincar com ela. Ah, e como Amanda gostava de brincar...

Por isso, Amanda adorava a escola: grande, cheia de amigos, brincadeiras, árvores e até bichos. Amanda passava o dia todo na escola, porque os pais trabalhavam muito. Todos os dias, ela era acordada por Neuza, sua única amiga neste apertamento, como ela sempre dizia. Esqueci de dizer que Amanda era uma menina por demais inteligente, que vivia brincando com a língua, inventando palavras e questionando tudo à sua volta. Pois bem, a velha amiga Neuza arrumava seu café e o especial a levava para a escola. Durante o café: “Já sabe, né, Amanda, nada de muita conversa...” e ela completava: “...’porque seu pai e sua mãe trabalham demais e precisam dormir’, já sei, Neuzinha, ‘deixa pra tagarelar na escola’, não é assim?” E Neuza balançava a cabeça e emendava com um sorriso: “Essa menina...”

Amanda se divertia muito na escola, e  a cada dia queria aprender mais e mais. Sempre muito alegre, era o xodó da Augusta da cantina, do seu Pedro da portaria, do disciplinário Jorge Altão – apelido dado pelos meninos porque Jorge era mesmo bem altão – e de suas professoras, todas encantadas com aquela menina que fazia poesia e cantava o Faroeste de Caboclo melhor que o mestre Renato Russo no ápice de seus 8 anos. Assim era Amanda: corria, sonhava, fazia e acontecia, criava mundos diferentes e gostava de ler e escrever. Amanda gostava de viver, e era feliz. Bem, até chegar em sua casa.

Às cinco e meia, Amanda se despedia de todos na escola e lá estava seu Dagoberto pra levá-la para casa. No especial, Amanda cantava músicas, recitava poemas, ria das piadas dos amigos – mesmo das que não entendia, porque não ficava bem admitir que não tinha entendido a piada -, era uma festa! Quando o especial dobrava a esquina, ela avistava sua única amiga no apertamento esperando de chinelos, avental e touca no cabelo, que a recebia com um sorriso no rosto largo e perguntava sobre as aventuras do dia. Amanda seguia o mesmo ritual: dava a merendeira para Neuza, guardava a mochila no quarto, tomava seu banho, colocava uma das roupas da pilha “roupas de casa” – isso mesmo: o guarda-roupas de Amanda era cheio de etiquetas dizendo pra que as roupas serviam –, jantava na cozinha com sua amiga e escovava os dentes. Em seguida, ela fazia o dever de casa no quarto, e seus pais sempre chegavam a essa hora.

Todos os dias, era a mesma coisa: “Oi, Amanda. Comeu? Tomou banho? Fez o dever de casa? Puxa, que dia cansativo! Vou tomar meu banho, comer alguma coisa e já venho falar com você.” Essa era a mãe. Pouco tempo depois, chegava o pai. “Oi, Amanda. Comeu? Tomou banho? Fez o dever de casa? Puxa, que dia cansativo! Vou tomar meu banho, comer alguma coisa e já venho falar com você.” E todos os dias Amanda fazia o dever de casa o mais bonito e caprichado que podia, e ficava esperando o pai ou a mãe vir ver. Mas nenhum vinha. Ela pegava seu caderno brochurão e ia até a sala para mostrar o para casa para o pai. Ele dizia a mesma coisa: “Amanda, não vê que estou ocupado agora? Estou assistindo ao jornal”. Amanda pedia desculpas e voltava para o quarto, pois sabia que o horário do jornal era o momento em que a mãe se empetecava de cremes, um após o outro, sempre em frente ao espelho, repetindo: “Eu sou uma pessoa bonita. Eu sou uma pessoa muito bonita”. Assim que o jornal acabava, Amanda corria cheia de esperança para o quarto da mãe, que dizia a mesma coisa: “Amanda, não vê que estou ocupada? Agora é hora da novela” e se sentava à frente da televisão. Não era permitido nenhum tipo de ruído nesse momento, e Amanda voltava para o quarto murchinha como uma planta que ninguém rega. E ficava sozinha. Bem, mais ou menos. É que Amanda tinha um passatempo muito gostoso: ler. Ela lia, lia, lia suas revistinhas da turma da Mônica, seus livros de contos e os poemas mais lindos de Cecília Meirelles. E sonhava. Em seus sonhos, seus pais passeavam com ela, brincavam com suas bonequinhas no cantinho do seu apertamento, sorriam, abraçavam e beijavam sua filhinha... Acordava às seis da manhã com um cafuné de Neuza. E não entendia porque as histórias dos livros eram tão diferentes da sua. E começava tudo de novo. Nos finais de semana, os pais estavam sempre muito cansados para ela, e dormiam muito, saíam bem tarde e dormiam muito de novo. E Amanda rezava para chegar logo a segunda-feira, e com ela a escola.

Um dia, depois de muito pensar, pensar e quase quebrar sua cabecinha pensando, Amanda descobriu uma maneira de ficar mais tempo com seus pais: assistindo televisão! Era só sentar-se no sofá e ficar bem quietinha. Quem sabe se nos intervalos do jornal o pai perguntaria como foi a escola ou pediria para ver seu trabalhinho de artes? Quem sabe se nos intervalos da novela a mãe pentearia seus cabelos ou pediria para ver alguma de suas bonecas? E assim ela ia, cheia de esperança, até o sofá, carregando o pente, a boneca e o trabalhinho, e se sentava em silêncio. E esperava até a propaganda, mas qual! A propaganda também era importante, e ela concluiu que não se podia falar enquanto a televisão estivesse ligada. De jeito maneira, simples assim. E assim Amanda passava suas noites: sentava-se ao lado do pai e da mãe, e assistia ao jornal e à novela. Foi aí que o mundo de Amanda começou a mudar. Ela via pessoas chorando no jornal e muitas maldades na novela. A menina sonhadora e alegre abandonou seus livros e histórias para mergulhar num universo chamado “novela das oito”, depois de acompanhar as catástrofes da vida real no jornal nacional. Ela pensava, pensava, mas não entendia porque as pessoas faziam aquelas coisas horríveis umas com as outras, e nem porque Deus deixava enchentes levarem casas, furacões destruírem cidades e tsunamis afogarem tanta gente. Por que as histórias dos livros eram tão diferentes das que via na televisão? Mas o que Amanda não entendia mesmo era por que seus pais ficavam tão vidrados assistindo a toda aquela tristeza.

Na novela, Amanda via pais que não gostavam dos filhos, filhos que não gostavam dos pais e todo o tipo de crueldade. Nesse novo universo, as pessoas mentiam, faziam as outras ficarem tristes e as coisas feias não tinham limites. Não foi difícil para nossa pequena amiga chegar à seguinte conclusão: MEUS PAIS NÃO GOSTAM DE MIM. Eles não se importam comigo, preferem ver essas coisas feias a ficar comigo, e gostam de assistir a esses pais que não gostam dos filhos e que fazem maldade com eles na televisão...

Puxa, como ficou apertado o coraçãozinho de Amanda depois daquela descoberta! Contou para Neuza, que só disse “deixa de bobagem, Amanda”, mas não conseguiu convencer a menina do contrário. Tudo fazia sentido para ela – o que estava na novela e no jornal era a mais pura verdade, os seus livrinhos eram bobos e só tinham historinhas de mentira. Agora ela não acreditava mais em Papai Noel, nem no coelhinho da Páscoa, e nem mesmo na Fada do Dente. Que tristeza!

Amanda ficou triste, chorou, chorou, e um dia decidiu: não iria gostar dos pais também. Não quis mais mostrar os trabalhinhos, não quis mais fazer os deveres caprichados e disse à professora Inês que não apresentaria mais o poema de homenagem às mães na próxima semana. Engolia o jantar e fazia o dever o mais rápido possível, só para se enfiar na cama e fingir estar dormindo quando os pais chegassem do trabalho. A mãe corria à cozinha preocupada: “Neuza, Amanda está doente?” O pai ia ao quarto de Amanda, sempre escuro, e corria à mãe, preocupado: “O que essa menina tem, meu Deus?” Neuza se limitava a dizer: “Culpa dessa televisão...”. Ninguém entendia nada. Os dois davam de ombros e voltavam a assistir a seus programas preferidos.

Um dia, a professora Inês, preocupada e disposta a animar sua melhor aluna de português, preparou uma aula muito interessante sobre nomes. Ela levou um livro bem grande para a sala e mostrou aos alunos o significado do nome de cada um. Os meninos se animaram bastante: Pedro rolou de rir quando descobriu que seu nome significava “pedra”, Érika se gabou ao saber que seu nome significava “poderosa como uma águia”, e Marina achou muito legal seu nome significar “do mar”, já que ela gostava bem de uma praia. Amanda olhou o dela: “digna de ser amada”. Achou estranho, não entendeu muito bem e já ia desistir de entender quando a professora Inês lançou o desafio: como dever de casa, os alunos deveriam perguntar aos pais por que eles haviam escolhido os seus nomes. E agora, o que Amanda iria fazer? “Ai, meu Deus, vou ter que conversar com meus pais”, pensou. Pediu à professora para fazer uma pesquisa na internet, sugeriu perguntar aos pais de sua vizinha, também chamada Amanda, mas ela foi categórica: “essa pesquisa tem que ser feita com os seus pais”.

Amanda respirou fundo e voltou para casa pensativa. Não cantou músicas, não recitou poemas e nem riu das piadas dos amigos. Não tagarelou no jantar, como costumava fazer, e dessa vez foi Neuza quem estranhou: “Amanda, o que é que você tem, menina?” Amanda explicou o problema à amiga, que só disse “Deus escreve certo por linhas tortas”. Ah, essa Amanda não entendeu mesmo. Coçou a cabeça e olhou pra Neuza confusa. “Um dia você vai entender, Amanda, um dia você vai entender”...

É, o jeito era mesmo encarar a fera – ou seja, o jeito era conversar com seus pais. Jantou e foi para o quarto aflita, ensaiando na frente do espelho o que iria dizer. Nesse dia, os pais de Amanda chegaram juntos em casa, e foram direto ao quarto da filha. Antes de abrirem a boca, a menina começou: “Oi, pai; oi, mãe. A professora Inês pediu que perguntássemos uma coisa aos pais para uma pesquisa, e como é para amanhã, vou perguntar agora e depois vocês podem tomar um banho, comer alguma coisa e assistir televisão.” Os pais de Amanda, surpresos, não sabiam o que dizer. Ela aproveitou a chance, pegou o lápis e o caderno, sentou-se na cama e continuou: “É só uma pergunta: por que vocês decidiram me chamar de Amanda?” Ela então se preparou para anotar a resposta, e qual não foi a sua surpresa ao ver seus pais com os olhos marejados de lágrimas, olhando para a menina com tanta ternura que ela nem conseguia acreditar! Os pais de Amanda se sentaram na cama, cada um de um lado. A mãe pegou o lápis da pequena mão da filha e escreveu no caderno brochurão:

AMANDA

Nossa amiguinha não entendeu patavinas, e já ia começar a perguntar quando a mãe explicou: “Eu e seu pai escolhemos esse nome para você porque dentro dele existem três palavrinhas que dizem como queríamos nossa filhinha: alguém que AMA as pessoas e os animais, a natureza e a vida; que MANDA em seu destino e escolhe seu próprio caminho; e que sempre será, acima de tudo, muito AMADA.” A mãe de Amanda começou a chorar e a abraçou forte. O pai acariciou-lhe os cabelos e beijou suas trêmulas mãozinhas. Seria um sonho? Amanda, com uma vozinha que quase não saía de tanta emoção, perguntou tímida: “Uai... mas vocês gostam de mim?” Ao que os pais riram e responderam: “Claro, minha filha, que pergunta é essa?” Amanda sentiu um frio na barriga, e ficou com medo que aquele momento acabasse, e pensou que os pais iriam acabar brigando com ela porque ela falava demais, e começou a ficar brava com ela mesma por sempre querer saber de tudo. Pensou, olhou para os rostos confusos do pai e da mãe, e resolveu que ela tinha que saber. “Eu achei que vocês não gostavam de mim, porque os programas que vocês assistem na televisão são cheios de famílias que brigam e pais e mães que não gostam dos seus filhos. Vocês não olham o meu dever de casa, nunca viram meus trabalhinhos de artes e nem sabem que a minha professora acha muito legal os poemas que eu escrevo. Vocês não me levam para passear e nem brincam comigo. Puxa, vocês nem conversam comigo, sabe? Parece que vocês gostam mais da televisão do que de mim...” O queixinho de Amanda ficou trêmulo e uma lágrima rolou do seu rostinho redondo. Os pais não sabiam o que dizer. O pai pegou a menina pela mão e começou, muito emocionado: “Você tem razão, Amanda. Nós estamos sempre tão cansados que nunca temos tempo pra você, né? Todos os dias eu digo que vou falar com você e vou assistir televisão. Só agora percebi que você começou a assistir televisão pra ficar perto da gente, pelo menos um pouquinho...” e não conseguiu continuar. A mãe de Amanda segurou seu rostinho redondo, limpou a outra lágrima que caía e disse: “Minha Amanda, você é tão especial, muito mais do que eu e seu pai sonhamos! Você nos enche de orgulho, e essa correria de todo dia fez a gente se esquecer de te mostrar o quanto te amamos... fez a gente se esquecer que você é uma criança, que gosta de brincar, tomar sorvete, passear no parque, que precisa de carinho e atenção. Nós te amamos muito, e prometo que vamos nos lembrar de regar nossa plantinha todos os dias.” Os três ficaram ali, abraçados, por um longo tempo. Foi o abraço mais gostoso da vida de Amanda, e ela ficou feliz demais, porque sabia que a plantinha era ela.

No dia seguinte, uma surpresa: os pais de Amanda vieram acordá-la com um beijo e um café bem gostoso. O pai disse que daquele dia em diante iria levá-la à escola. Nem precisa dizer que nossa amiguinha era só sorrisos na aula de português. Contou animada aos colegas e à professora sobre a escolha de seu nome, e no final da aula perguntou se ainda poderia recitar o poema do dia das mães. A professora Inês ficou muito animada, e disse que não tinha dado o poema a mais ninguém, pois sabia que ela acabaria mudando de idéia. Percebendo a mudança de Amanda depois do trabalhinho, a professora pensou alto: “Deus escreve certo por linhas tortas.” Dessa vez ela entendeu: Deus escrever por linhas tortas era uma coisa ótima.

Amanda voltou para casa feliz da vida e contou a Neuza tudo que tinha acontecido. A amiga sorriu e gostou muito das novidades, mas ainda estava preocupada: e a televisão? Amanda deu a merendeira para Neuza, guardou a mochila no quarto, tomou seu banho, colocou uma das roupas da pilha “roupas de casa” – caso vocês não se lembrem, o guarda-roupas de Amanda era cheio de etiquetas dizendo pra que as roupas serviam –, jantou na cozinha com sua amiga e escovou os dentes. Acabou tudo isso e foi para o quarto fazer seu dever de casa, aflita, sem saber o que a esperava.

Os pais de Amanda chegaram juntos, com algumas sacolas nas mãos. Entraram no quarto, deram um beijo na filha e entregaram as sacolas. Sem entender muito bem, Amanda abriu as sacolas e quase teve um troço quando viu o que tinha dentro: livros! Muitos livros! Toda a coleção da Casa Amarela, com Rubião Gatão, Leiloca Gatoca e outros felinos em histórias que mexiam com sua imaginação. Para Gostar de Ler, com muitas aventuras contadas por Monteiro Lobato. Os Três Porquinhos Pobres, uma história pra lá de divertida do Érico Veríssimo. E um livro bem grande, chamado “A História Sem Fim” – “esse é pra você ler daqui a um tempo, minha filha, pra nunca deixar de sonhar”, a mãe disse. Os olhos de Amanda brilhavam, e o pai anunciou que todos os dias ele e a mãe leriam uma história para ela. No ápice de seus 8 anos, Amanda pulou de felicidade, e para sempre sentiu-se a menina mais sortuda do mundo, simplesmente porque se chamava Amanda.