É bizarro assistir ao dueto prazer e culpa como mero espectador. Quase tão estranho quanto aquelas mulheres que usam calcinha fio dental com calça de viscolycra e acham que todo mundo tem algo melhor pra fazer do que notar aquilo. Incômodo como passar alguns bons minutos no balcão da pastelaria esperando pelo seu pedido e não ouvir nenhum por favor ou obrigado nesse intervalo. É como os alunos do cursinho de inglês classe AB, que de tão mal criados acham educado quando os funcionários respondem à sua indiferença. Comer um pastel enquanto um moço cheio de viço - e Madonna no ouvido - passa pingando pela estrada afora é um sacrilégio que pede Coca zero com trinta minutos de esteira, quinze de bicicleta e uma nova avaliação física. O lema é seguir o que manda o coração, e sem muito conhecimento de biologia é fácil confundi-lo com o amigo logo abaixo que, você acredita, tem quase a mesma proporção. Nos embalos de domingo à tarde, viajar é igual a mergulhar de cabeça nos quitutes de uma terra distante, ainda que congelados e made in somewhere else. A anarquia é tamanha que os propósitos de outrora se perdem como os garotos presos à Caverna do Dragão, até aquele velho par de jeans denunciar cada flácido exagero. Frente ao espelho, potranca ou pelanca soam como uma palavra só, a render as outras como dor de cabeça em dia de ressaca. Sem exercício ou alegria que o saúde, o carro te abraça livre de julgamentos; ao som de You only live once, aquele cara de camisa preta fica parado enquanto você passa, e você acena enquanto pensa que ele está mais bonito do que nunca, porque certamente se encontrou na vida, ele que era tão franzino e inexpressivo e ainda assim te encantava. Você tenta guardar aquela imagem com cuidado, com força, quer que ela rodopie outras tantas vezes pela sua cabeça, até você esquecer que na verdade nunca se lembrou daquela cara desde que fechou-se a porta; até você lembrar que sempre se esquece que prazer e culpa soam como uma palavra só, a render as outras como dor no olho em dia de muito sol. Até você esquecer que se lembra; lembrar que não se pode mais esquecer coisa alguma. A noite cai; é hora de voltar para casa.
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