"Que tempos penosos foram aqueles anos - ter o desejo e a necessidade de viver, mas não a habilidade". Cruzei com essa verdade inequívoca logo no início de Misto Quente, obra-prima de Bukowski. Interessante demais uma pessoa de outro lugar, outro tempo e espaço traduzir sua alma de um jeito que nem você havia sido capaz até topar com esse pedaço de resposta. Não sei precisar por quanto tempo me senti assim, estrangeira em mim mesma, perdida em vozes, formas, instintos insidiosos por puro desconhecimento do que eu aqui fazia, do que precisava fazer e de como habitar esse mundo inóspito de tantas maneiras sem levantar suspeitas dessa inabilidade. Foi sofrido, foi complicado lidar com olhares furtivos em braços cruzados, foi triste sucumbir, foi desleal me desvalorizar quando o que eu queria era paz e amor em cascata, gelo seco cor de rosa subindo pelas pernas da mesa. Lembro do Mathias tocando Creep no show de calouros do colégio e penso na minha inabilidade em compreender aquela letra, mesmo que aquele momento e aquela música tenham estranhamente grudado nas minhas entranhas, como se eu tivesse que saber. Se a gente era legal? Se dava pra ser mais que aquilo? Se é possível, saudável confiar, acreditar, esperar... Esses banhos de efeito borboleta que a gente se dá antes de experimentar um batom novo, dar uma banana pra sociedade na frente do espelho e se arrepender 2 minutos depois e voltar e dizer desculpa, sociedade, preciso de você, sociedade, espera eu tentar me ajustar, sociedade... pra viver como eu quiser. Sem cigarro porque faz mal; com cerveja que a onda é boa; mergulhando de quando em quando no sol quente com água gelada, Sonrisal de dor antiga e dor nova. Penoso pode remeter a tanta coisa... mas a inabilidade tem que ser superada - a inabilidade tem que ser perdoada para que os anos e as pessoas e os números e as notícias possam caber dentro das nossas esperas, que os anúncios sejam só um prelúdio particular de futuros desafetos e que todos fiquem com Deus, com Jah, com Buda, com o cosmos, com o Big Bang. Somos todos heróis por ainda estarmos aqui. Tomo cerveja, leio Bukowski, ouço Into the Wild e tenho quase certeza de que vai ficar tudo bem.
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