sábado, 14 de fevereiro de 2009

Capítulo 8 - Madame Satã: a batalha final

O bem vence o mal
Espanta o temporal
Azul, amarelo
Tudo é muito belo!...


Aqui tá sendo uma novela mesmo, gente, e como diria uma pessoa muitíssimo sabia... SURREAL! Madame Satã pirou tanto minha cabeça que tive que sair de lá. Ela é um ser tão deprimido, tão reprimido e tão encardido que esse climão depressão começou a tomar conta de mim sempre que eu tava na casa dela.

Rebobinando um pouco a fita: lembram-se que no primeiro capítulo disse que a dona da casa era um pouco estranha? Bem, resumindo bastante, aí vão os fatos mais marcantes: 1) depois de um dia inteiro dentro de um avião, eu cheguei na porta da casa dela e fui recebida com regras hitlerianas, que foram pregadas pela casa num estilo totalmente “no mercy”; 2) sua figura, juntamente com seu inconfundível sotaque, claramente indicavam que ela era do Paquistão e ela insistia em dizer que era alemã, como se isso melhorasse alguma coisa; 3) basicamente, ela era uma senhora solitária, deprimida, paranóica, que não deixava a gente usar a cozinha, nem conversar na casa, nem entrar no banheiro das 7 às 7.30. Tudo normal, mas o melhor de tudo é que ela era fanática por Jesus. Aí pensei comigo: uma criatura sinistra dessa que, como se não bastasse, ainda é fanática por Jesus, precisa muito de salvação. Pronto: bem vinda à trama, MADAME SATÃ!

Pra começar, eu tinha que comer, beber, ler, conversar, trocar de roupa, ver tv, pentear o cabelo, pular corda, andar de bicicleta, plantar bananeira, tudo naquela polha daquele canário daquele quarto. E o quarto, como se já não bastasse, era o sonho de todo vendedor de móveis antigos - a loja pronta! Nunca vi tanto móvel junto... ele é do tamanho da biblioteca da Cultura Colégio Arnaldo, e tem uma cama de casal, um guarda-roupa, uma mesa com uma tv, uma cômoda, um sofá - repito: um sofá! -, uma mesa de centro (????) e uma penteadeira. Agora o mais trash: CARPETE COM TAPETE POR CIMA, VEEEEEEEEEEIIIIIIIIIIIII!!!!!!!!!!! Parece que ela nunca na vida deu uma olhadinha debaixo dos caracóis dos cabelos dos tapetes da casa dela, e quando eu, num tom super boa-praça, pedi pra dar uma olhadela sem compromisso no hoover, brasileiramente chamado de aspirador - eu ia mesmo é dar um grito, laçar o sujeito, me trancar no quarto e pedir resgate pra devolver - ela deu um sorrisinho sinistro - brrrrrrrr - e saiu. Só imaginem a situação - nem dá, né?

Pois bem, como se não bastasse toda essa atmosfera, vou eu na quinta passada tomar meu glorioso banho - ah, que bom, pelo menos o banho era quentinho, gostoso, tinha água... ops, eu disse "tinha" água? ISSO MESMO, GENTE, PORQUE SIMPLESMENTE NÃO TINHA MAIS!!! No que eu sacudi o chuveiro, liguei a torneira, desliguei, liguei tudo no máximo, no mínimo e no mais ou menos - e enquanto isso por favor compreendam que tava frio pra canário lá dentro - e NADA. A água foi ficando ralinha, xoxa, minguou... e secou! Pronto, eu, empacotadora de delivery, que significa basicamente ficar numa cozinha relativamente pequena sem exaustor ao lado da lava-louça com seu bafo, que consequentemente quer dizer que se vc não lavar o cabelo todo dia a coisa fica bem complicada... SEM ÁGUA NO BANHEIRO FALTANDO 15 MINUTOS PRA EU SAIR DE CASA!!! Beleza. Respira. Isso, lá no fundo. Putz, faz de novo então, vai ver dá pra captar alguma idéia com seu nariz wireless. Isso, tranquila. Ótimo. PUTAQUIPARIU, TÁ NA HORA DE TRABALHAR!

Bem, depois desse episódio um pouco complicado, resolvi que não podia mais ficar nem sem tomar banho e nem morando lá. Mas Madame Satã é assim: quando vc precisa dela, she’s never there. Você escuta passos, ouve vozes, mas quando bate na porta da casa dela - a casa dela é a sala, gente - ninguém responde. Percebi então que eu tinha que pensar num horário em que eu com certeza cruzaria com ela. Foi aí que me lembrei de um dos 7 bilhetes que ela pregou pela casa, com ordens ditatoriais que, segundo ela, deveriam ser cumpridas pra que a gente pudesse viver em família. Que lindo, né? Fala a verdade... Um desses bilhetes exibia a polida mensagem "Do not use bathroom from 7.00 to 7.30 - family use”. Agora ela sabia o que era família, hein? Ou seja: eu, ser solitário que habito esse museu, vou usar o banheiro nesse horário, e se você tiver vontade de fazer xixi entre 7.00 e 7.30, não é problema meu, HAHAHAHAHA!!! Resolvi esperar por ela no dia seguinte, às 7.15, porque, haja vista que o chuveiro estava sem água, ela iria sair logo, logo ou tomar alguma providência a respeito, não? Gente, que isso, surreal demais - alguém podia inventar uma palavra com o mesmo impacto, prometo que eu uso... Eis que a figura franzina greco-paquistanesa de cabelo louro cinza entra no banheiro, liga seu radinho e por lá fica. E eu escuto a água fluindo do chuveiro maravilhosamente durante vários minutos, ininterruptamente. Quando ela saiu do banheiro, nem sabia o que falar. Resolvi dormir mais um pouco e tomar um banho mais tarde. Obviamente, quando eu fui tomar banho... cadê a água? Será que o boi bebeu?

Aí eu pirei, mas novamente quando tentei falar... nada. No meio dessa nebulosidade, Marinão voltou pro Brasil e eu fui convidada pra ficar no lugar dela, numa casa de verdade, com internet de verdade, com uma cozinha de verdade - que isso, já estava até me esquecendo de como usar o fogão - e pessoas legais de verdade mesmo. Bom, deixa eu pensar, será que eu vou, será que vai ser legal, será que... SÓ SE FOR AGORA! Foi literalmente assim. Na segunda eu já estava com tudo empacotado, e assim que o pessoal chegou pra me buscar, apenas joguei minhas malas escada abaixo e me joguei junto com elas. Joguei a chave dentro do correio e senti a melhor sensação de todas, a de que nunca mais cruzaria com Madame Satã e sua cara de Mun-ha no caminho. Mas é claro, óbvio e evidente que não foi assim...

Na afobação de dar meu grito de liberdade, esqueci minha mala mais importante, com todos os meus documentos, dinheiro, passaporte, computador, enfim, minha vida, na porta da casa da enconha. No dia seguinte, tive que ir até lá debaixo de chuva, e ao tocar a campainha, ela abriu com aqueles olhos arregalados de psycho, deu um sorrisinho e eu vi que minha mochila estava exatamente no mesmo lugar, no meio do corredor. Que patético! Aí eu dei uma de psycho também, fui falando várias coisas meio enrolado enquanto ia pegando a mochila, o telefone dela tocou, ela disse que queria que eu entrasse em contato com ela pra esclarecer algumas coisas, ajudá-la ou algo do tipo, e como eu já sabia que ela jamais devolveria meu dinheiro - sim, porque eu havia feito o pagamento até o próximo domingo -, senti muito, quase chorei, e fechei a porta. Foi um dos momentos mais prazerosos da minha vida, devo admitir. Bem, e agora é só alegria! Minha casa nova e otima, estou finalmente comendo bem e fazendo cada coisa no seu devido lugar, se é que vcs me entendem...

Molti baci, a presto!

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